Papers by Martonio Mont'Alverne Barreto Lima
Beijing Law Review, 2024
This article seeks to investigate Karl Marx's reflection on the reification of social relations i... more This article seeks to investigate Karl Marx's reflection on the reification of social relations in the economic and political development of the capitalist system remains timeliness and useful. From the notion of reification-Verdinglichung-established in Book III of The Capital, it is an attempt to reinsert the subject in the current sociological-legal debate; a debate being developed in many places of the world. We consider the concept of reification as a concept-diagnosis, or at least an indispensable element of diagnosis of a historical epoch. This is due to the fact that such debate deals with a phenomenon linked to forms of consciousness and a set of social practices inspired by them that may single out a certain historical time. This thematic field has been abandoned by the social and legal sciences for years, at least since the 1980s. However, we emphasize that this theme was central to the German, Austrian, and Latin American debate in the 1920s and 1930s. Thus, the article originates from this historical need to propose a revised version of the reification concept, updated for modern times, giving Law a valuable ontological tool to explain its phenomenal forms of modernity.
Tirant Emporio do Direito Editorial LTDA eBooks, May 2, 2023
ius gentium, Sep 11, 2016
Verfassung und Recht in Übersee, 2011
Journal of Contemporary Private Law, 2020
Revista Brasileira de Estudos de Defesa, Jun 21, 2023
Revista Culturas Jurídicas, Aug 16, 2021
Revista Brasileira de Teoria Constitucional, Dec 3, 2016
O trabalho discute a interpretação conferida ao artigo 52, parágrafo único, da Constituição Feder... more O trabalho discute a interpretação conferida ao artigo 52, parágrafo único, da Constituição Federal, pela qual o Presidente do Supremo Tribunal Federal autorizou a separação do rito do impeachment no Senado Federal em dois momentos: inicialmente, foi votada a possibilidade da perda do cargo, e, posteriormente, os Senadores manifestaram-se sobre a imputação da inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública da então Presidenta Dilma Rousseff. Propõe-se a coerência hermenêutica do Judiciário, sob o enfoque da jurisdição constitucional.
DOAJ (DOAJ: Directory of Open Access Journals), Mar 1, 2021
Revista Brasileira de Direito, Dec 1, 2019
The present study analyzes the Rousseaunian assumptions that advocate democracy participated, in ... more The present study analyzes the Rousseaunian assumptions that advocate democracy participated, in view of the impossibility of eligibility of non-literate Brazilians under the aegis of the concept "excluded from within" proposed by Pierre Bourdieu and Champagne from the democratic perspective. The exercise of citizenship is not restricted to suffrage. At the heart of the Democratic Rule of Law is the representativeness of the plurality of individuals that make up society. The imposition of limits on political participation, as a fundamental right, whether in active or passive electoral capacity, is a paradox of the permanent process of democratization. Non-literacy per se is macrosystemic failure. This study is based on the epistemology of quanti-qualitative, analytical-critical research, developed from the use of multimethods to examine the praxis of representative democracy with interdisciplinary lenses. The data provided by the website of the Superior Electoral Court (TSE) are analyzed, as well as the political, legal and anthropological concepts present in the current literature and the legislation related to the theme, aiming to answer: to what extent the pseudo-inclusion of nonliterate people in the Brazilian electoral system made them "excluded from within" in the face of participatory democracy? At this juncture, the objective is to analyze the compatibility of the principles of equality and popular sovereignty in the face of the ineligibility of non-literate people with a fulcrum in the systematization of essential democratic elements. It is concluded that to break the stigmatization of illiterates in the democratic system is necessary, their insertion and educational incentive is necessary.
perante. Agradecemos a todos que colaboraram com a versão fi nal do artigo, especialmente os func... more perante. Agradecemos a todos que colaboraram com a versão fi nal do artigo, especialmente os funcionários, professores coordenadores e diretores da UBA, UMSA, Universidades do Porto, de Lisboa e Coimbra e aos professores Cláudia Rosane Roesler, Fábio de Sá e Silva, Gustavo Ferreira, Welber Barral e Ana Maria D. Lopes, pelas importantes críticas.
Pensar, 2006
O texto enfrenta a discussão sobre o fenômeno com o qual se deparam as sociedades a partir da seg... more O texto enfrenta a discussão sobre o fenômeno com o qual se deparam as sociedades a partir da segunda metade do século XX, isto é, aquele do crescimento da jurisdição constitucional. As exigências sobre as constituições dirigentes, especialmente aquelas da América Latina após os anos 80, redirecionaram o Poder Judiciário à condição de importante ator político, em desenhos constitucionais cuja ação prioritária era do Poder Legislativo. O trabalho critica esta situação, a partir da teoria política da democracia.
Pensar, Feb 12, 2010
O texto enfrenta a discussão sobre o fenômeno com o qual se deparam as sociedades a partir da seg... more O texto enfrenta a discussão sobre o fenômeno com o qual se deparam as sociedades a partir da segunda metade do século XX, isto é, aquele do crescimento da jurisdição constitucional. As exigências sobre as constituições dirigentes, especialmente aquelas da América Latina após os anos 80, redirecionaram o Poder Judiciário à condição de importante ator político, em desenhos constitucionais cuja ação prioritária era do Poder Legislativo. O trabalho critica esta situação, a partir da teoria política da democracia.
Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito
O presente artigo visa investigar documentos jurídicos datados nos períodos do Brasil colonial, i... more O presente artigo visa investigar documentos jurídicos datados nos períodos do Brasil colonial, imperial e republicano, a fim de discutir o lugar do índio na história brasileira, abordando o ordenamento jurídico nacional diante das populações indígenas da época até os dias atuais. Desse modo, analisa-se que, desde a primeira Carta Magna de 1824, até a Constituição Federal de 1988, os nativos eram considerados desprovidos de autonomia e “não civilizados”. Por isso, deveriam ser integrados à comunhão nacional pela imposição da visão eurocentrista, das suas culturas e leis. O objetivo da pesquisa cuida de demonstrar a evolução no tratamento dos povos indígenas, conforme as análises das legislações vigentes à época, tendo como pressuposto a importância desses povos para a construção da história do Estado nacional brasileiro. O artigo será apresentado com base em estudo descritivo-analítico, utilizando-se do método dedutivo, com investigação bibliográfica em livros dos principais expoent...
Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêutica e Teoria do Direito, May 24, 2022
Este é um artigo de acesso aberto, licenciado por Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (... more Este é um artigo de acesso aberto, licenciado por Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0), sendo permitidas reprodução, adaptação e distribuição desde que o autor e a fonte originais sejam creditados.
Cadernos de Ética e Filosofia Política, Aug 23, 2022
Resumo: O principal objetivo deste artigo é realizar uma crítica ao argumento segundo o qual o pr... more Resumo: O principal objetivo deste artigo é realizar uma crítica ao argumento segundo o qual o princípio majoritário apresenta riscos à democracia, usualmente empregado pelos defensores da legitimidade democrática do controle jurisdicional de constitucionalidade das leis. Em uma sociedade democrática, onde os princípios da liberdade e da igualdade são adotados, o princípio majoritário fornece um critério justo para identificar os pontos de vista que devem prevalecer ao final de processos coletivos de tomada de decisão. As regras da unanimidade e da maioria qualificada são insuficientes para corrigir as alegadas injustiças produzidas pelo princípio da maioria, em virtude das dificuldades de efetivação que possuem, da ausência de real proteção às minorias e das contradições internas que apresentam. Embora seja possível imaginar um sistema jurídico no qual o princípio majoritário viabilize a existência de uma tirania ou ditadura da maioria, presumir que, nesse contexto, os juízes necessariamente formarão o grupo de defensores dos direitos das minorias é realizar uma aplicação seletiva do princípio da igualdade. Palavra-chave: Democracia-Princípio majoritário-Jurisdição constitucional A defense of the majority principle in the context of debates on democratic legitimacy of judicial review of legislation Abstract: The main objective of this article is to promote a critique to the argument according to which the majority principle presents risks to democracy, usually employed by the advocates of the democratic legitimacy of the judicial review of legislation. In a democratic society, where the principles of freedom and equality are adopted, the majority principle provides a fair criterion to identify the points of view that ought to prevail at the end of collective processes of decision-making. The rules that require unanimity and qualified majority are insufficient to right the alleged injustices produced by the majority principle, by virtue of the difficulties they face to be enforced, the absence of real protection for the minorities and the internal contractions they show. Although it is possible to imagine a legal system in which the majority principle makes the existence of a tyranny or dictatorship of the majority possible, to assume that, in this context, judges will necessarily form the group of defenders of minorities' rights is to promote a selective application of the equality principle.
Uploads
Papers by Martonio Mont'Alverne Barreto Lima
O que chama a atenção é a reação que se assiste à regulação. De um lado, empresas de alta tecnologia e entidades que se beneficiam da completa ausência de regulação disfarçam seu interesse monetário em defesa da “liberdade de manifestação de pensamento”. Por outro lado, recorrendo ao mesmo disfarce, atores políticos das bancadas evangélicas e conservadoras trombeteiam a ameaça de sua liberdade de continuar divulgando inverdades, alegando que o PL 2630/22 limitará sua atuação. No que estão corretos!
O PL 2630/22 aparece precisamente para impor limites à liberdade de manifestação de pensamento criminosa e mentirosa. Surge na esteira do que a democracia moderna tem de mais precioso: a imposição de limites econômicos, políticos e sociais, como nos advertiu Noberto Bobbio, quando afirmou que a democracia é um sistema de limites.
Os limites econômicos não deveriam surpreender a ninguém. Qualquer investidor saber disso, já que se supõe que seja conhecedor da Constituição e das leis que temos. Estes textos legais não deixam dúvidas de que temos um Estado dirigente e intervencionistas. Seria risível desejar que o Estado, autorizado pelo poder constituinte e igualmente limitado, não lançasse mão das atribuições que a Constituição lhe manda exercer.
No mundo inteiro, há vozes – sinceras e insinceras – que reconhecem o estrago das notícias falsas para a democracia, além da disseminação do criminoso discurso de ódio. No Brasil, os casos recentes de proliferação deste discurso trouxeram tragédias que outros países já vivem, como as mortes em escolas. A necessidade de órgão do Estado democrático que disponha da civilizada legalidade para identificar, combater e punir autores ou cúmplices facilitadores de tais crimes nada tem de inconstitucional, tampouco de ameaçador das liberdades individuais. É o contrário que se opera. O Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, conforme disposto no art. 25 do PL 2630/22 conta com integrantes do Estado e da Sociedade, além de ser organismo vinculado ao Poder Legislativo e que atuará como entidade de avaliação das ações em defesa da democracia. Onde estariam ameaçadas a criatividade, a liberdade de expressar críticas contundentes ou a tomada de posições divergente?
O que não se pode aceitar na convivência democrática é a sua própria destruição. Chegamos até aqui sabedores do que a falta de limites foi capaz de convencer populações inteiras, por exemplo, de que era necessário o extermínio de certas categorias de pessoas; tudo às custas do discurso falsificado da história, do pensamento político. Uma vez que no Brasil celebramos um pacto civilizatório em 1988, não há como deixar de reconhecer que o PL 2630/22 é mais um elemento que dialoga e fortalece este pacto. Que seja, então, aprovado e convertido em Lei.
Demais Poderes e órgãos públicos devem se comprometer com o Estado Democrático de Direito, ficando responsáveis os partidos políticos pela mesma democracia, conforme art. 17. Eis a origem dos membros do Legislativo, que são responsáveis por resguardar o regime democrático, juntamente com a guarda da Constituição pelo Supremo Tribunal Federal.
A Constituição desenhou, ainda, um complexo orgânico na “Organização dos Poderes” (Título IV), formado pelas instituições protagonistas do sistema de acesso à justiça: Defensoria Pública, Ministério Público e Advocacia Pública e Advocacia Privada. Tais instituições foram inscritas topicamente em capítulo próprio, fora dos demais, que preveem os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e devem guardar em suas missões o valor máximo da defesa do regime democrático.
De forma explícita a Constituição incumbe ao Ministério Público a defesa do regime democrático e à Defensoria Pública o ser expressão e instrumento do regime democrático. Também a Constituição revela que a Advocacia-Geral da União é a instituição que representa a União, e, em sendo a esta incumbida a competência de zelar pela guarda das instituições democráticas, por uma decorrência lógica a execução das leis que buscam salvaguardar a democracia, deve ser realizada pelo Poder Executivo por todos os seus órgãos, inclusive pela AGU.
Apesar desta expressa missão conferida aos entes de direito público interno, houve estranhas surpresa e crítica quando, no dia 1º de janeiro de 2023, edição especial do Diário Oficial publicou o Decreto 11.328, que “Aprova Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança da Advocacia-Geral da União e remaneja cargos em comissão e funções de confiança”, criando Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia (PNDD), cujas funções seriam: (i) representar a União, judicial e extrajudicialmente, em demandas e procedimentos para defesa da integridade da ação pública e da preservação da legitimação dos Poderes e de seus membros para exercício de suas funções constitucionais; e (ii) representar a União, judicial e extrajudicialmente, em demandas e procedimentos para resposta e enfrentamento à desinformação sobre políticas públicas (art. 47).
A crítica à criação da PNDD se fundamentaria na ausência de definição de critérios e esclarecimentos sobre a atuação desta nova Procuradoria A oposição à recém-criada Procuradoria tem feito críticas como um possível mecanismo de censura, ou de que suas funções caberiam melhor ao Ministério Público, como se este não já detivesse esta atribuição, na conformidade da solar redação do art. 127 da Constituição.
A partir dos estarrecedores, embora esperados, acontecimentos de dia 8 de janeiro de 2023 e da pronta atuação da Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia ante a inação de outros atores, parecem sem razão as críticas proferidas.
Os atos praticados na Capital da República, que destruíram as sedes dos Três Poderes, podem ser considerados como uma obra conjunta: de terroristas, de grande parte da mídia, de políticos e de instituições que não funcionaram como e quando se esperava.
Na ordem apresentada, os terroristas disfarçados de “patriotas” foram incentivados e organizados ao longo dos últimos seis anos para este desfecho, especialmente por uma elite econômica que jamais aceitou a universalização de direitos, tampouco assimilou a ideia de uma democracia econômica para amplos setores de nossa sociedade. A empregada doméstica na Disney e sua filha nos bancos da faculdade de medicina incomodaram muito.
Quanto à grande mídia, até um desatento observador saberia qual o resultado da equação promovida quando fora potencializada a criminalização e espetacularização da política, transformando a avareza econômica e intelectual de uma classe média em covarde e falsa indignação moral, em ódio aos mais fracos e pobres e idolatria aos fortes e ricos.
Por sua vez, os políticos que deram apoio ao golpe de 2016 rapidamente compreenderam que o espaço para Bolsonaro e o bolsonarismo estava se abrindo. Embarcaram nessa aventura e, a despeito de pandemia, notícias de corrupção, aparelhamento da burocracia pública, benesses para apoiadores e destruição de nossa soberania econômica, não arredaram pé do apoio a um dos piores governos que o Brasil conheceu. Após 30 de outubro de 2022, muitos saltaram do barco. Outros ainda tocam seus violinos no convés.
Quanto às instituições omissas, a marcha dos terroristas contra a institucionalidade democrática cruzou caminho com uma apática e aparentemente conivente força policial, que somente interveio quando as sedes dos Poderes da República estavam praticamente destruídas. Antes, entre 2014 até 2022, alguns membros do Ministério Público Federal e da Justiça Federal se constituíram em pivôs da instabilidade institucional do País, sendo necessário que o acaso providenciasse as provas do conluio da operação lava jato, para que o Supremo Tribunal Federal revisse o estrago democrático, e procurasse salvar o que ainda poderia ser salvo.
Como foi possível a sucessão de acontecimentos que levaram ao 8 de janeiro, quando já se sabia dos planos dos terroristas? Onde estavam as autoridades federais e do Distrito Federal que não se moveram para qualquer ação preventiva? O caldo fica mais entornado quando se sabe que o Ministério Público tem como obrigação constitucional do controle externo da atividade policial. Não sabiam do que se preparava, desconhecendo as ligações políticas de integrantes das forças policiais federais, estaduais e distritais com os partidários do bolsonarismo? Estas ligações são tão abertas que basta um desatento olhar para a representação política das bancadas da bala no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas e Câmara Distrital, e Câmaras Municipais.
Não se pode admitir que o setor armado de nossa sociedade esteja nas mãos de dirigentes que sejam mais leais aos seus interesses localizados do que à institucionalidade democrática. Não se pode admitir que decida aquela que tem as armas: quem tema armas obedece; quem decide – os Poderes eleitos, isto é, Executivo e Legislativo – não tem armas. É assim que está na Constituição.
Eis a inação institucional que também responde pelos episódios de 8 de janeiro de 2023, cujos atos de destruição – física e institucional – envergonharam o Brasil perante a comunidade internacional, como bem destacou Lenio Streck em sua coluna diária neste Conjur .
Decorrente desta omissão, a Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia é uma necessidade, cuja implantação algumas sociedades já há muito tempo compreenderam, como a Alemanha que criou seu Serviço de Proteção Constitucional desde novembro de 1950. De lá para cá, nenhum governo de direita, de esquerda ou centro-esquerda da Alemanha foi acusado de censura. E a existência deste Serviço não se confundiu com a atuação da persecução penal e civil sob a responsabilidade do Ministério Público ou com a atuação de porta de acesso à cidadania e à dignidade às pessoas e coletividades necessitadas a cargo da Defensoria Pública.
O temor em torno da criação da PNDD resta ainda esvaziado com a publicação da Portaria Normativa nº 80/2023 da Advocacia-Geral da União, que cria um Grupo Especial de Defesa da Democracia (GEDD para realizar o “acompanhamento das apurações e investigações relacionadas com os atos antidemocráticos praticados na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023, e outros danos a bens públicos federais correlatos”, convidando a participar deste grupo representantes do Supremo Tribunal Federal, Senado Federal, Câmara dos Deputados, Casa Civil da Presidência da República, Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República e Ministério da Justiça e Segurança Pública .
O certo é que a promoção, consecução e defesa da democracia é atribuição de todos os entes, órgãos e agentes públicos, bem assim de todo e qualquer cidadão, não havendo respaldo constitucional para que qualquer um destes se arrogue na exclusiva competência de fazê-lo.
As lições que tiramos desta tragédia recente brasileira somente serão conhecidas com o passar do tempo. O que temos até o momento, porém, é revelador da urgência do compromisso de formação de cultura democrática na burocracia nacional, para além dos Poderes constituídos e das Instituições responsáveis pela defesa e pela guarda da Constituição, em especial, relativamente aos componentes das forças armadas e policiais, e se espera que a criação da Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia seja uma alentadora iniciativa neste sentido.
Eis o autêntico liberalismo econômico e político, que conviveu com escravidão, num duradouro casamento, interrompido somente por forças que lhes eram exógenas.
Na semana passada, a Suprema Corte dos Estados Unidos confirmou apenas uma das deficiências da democracia americana. Na semana anterior às férias de verão, a Suprema Corte: 1) anulou centenária lei que restringia o porte de armas em vias públicas no Estado de Nova York; 2) declarou que escolas confessionais podem receber dinheiro público, ainda que neguem a evolução das espécies e rejeitem estudantes transgêneros; e 3) revogou o direito de aborto, estabelecido há quase cinquenta anos no caso
Roe. vs. Wade. Constata-se a procedência das afirmações do professor da Universidade de Chicago, Ian Millhiser, no seu livro Injustices: de que a história da Corte é aquela de afligir os já aflitos e de confortar os já confortáveis.
Estas 3 decisões foram tomadas exatamente em correspondência à nova maioria conservadora da Corte: por 6 votos contra 3. Os dois últimos casos chamam nossa atenção pelo inexorável vínculo com o obscurantismo religioso que se esconde numa pretensão de racionalidade da decisão judicial, mas que apenas serve de disfarce para impor uma concepção religiosa sobre todas as outras concepções religiosas, políticas e sociais. Quem faz a razão serva da fé, não enlouquece sozinho: obriga os outros a enlouquecerem juntos.
Não sem razão que Schmitt foi preso duas vezes após a Guerra: em 1945, por 12 meses; e em 1947, por 5 semanas, quando foi interrogado no Tribunal de Nuremberg. O interrogatório foi bem registrado por Helmut Quaritsch, na obra “Repostas em Nuremberg”, publicada em 2000, embora desde 1987 já se conheça o teor dos depoimentos.
Um dos textos de Schmitt desta época é o infame “O Führer protege o Direito” (Der Führer schützt das Recht), de 1º de agosto de 1934. Em 30 de junho de 1934 Hitler ordenou os assassinatos de membros de seu próprio partido. O episódio ficou conhecido como a “noite dos punhais”. O mesmo Hitler concluiu a operação com a promulgação da “Lei de Medidas de Emergência de Defesa do Estado, de 3 de julho de 1934”, que se resumia a um único artigo: "As medidas executadas para suprimir os ataques de alta traição e traição em 30 de junho, 1º e 2 de julho de 1934 são legais, na forma de defesa da emergência do Estado”.
Em outras palavras, Hitler deu a si próprio a imunidade, por meio da lei. Schmitt afirmou que tais atos normativos resultavam da ação do Führer para unir em si toda a “indignação” resultante da história da “infelicidade” do povo alemão. Tais elementos atribuiriam ao Führer o direito e a força de “fundamentar um novo Estado e uma nova ordem”. Diante de tal cenário, a manifestação de Hitler de que “nesta hora sou responsável pelo destino da nação alemã e por isso também sou o supremo senhor do tribunal do povo alemão”, traduzia-se para Schmitt, na forma de que “o verdadeiro Führer sempre será também o juiz”.
Não se trata aqui de mero oportunismo político-partidário, e sem importância, já que Schmitt, como ele disse perante o Tribunal de Nuremberg, era somete um intelectual. Como Epimeteu, que não foi capaz de se dar conta do que lhe estava diante dos olhos, e aceitar a lição sobre o futuro oferecida por seu irmão, Prometeu, o exemplo de Schmitt é uma advertência a todos. Especialmente para juristas.
O manejo da legalidade pode conduzir a razão para o mal. Destituir-se do horizonte que já se conhece por meio da história, não é posição que deva ser encarada com uma livre e simples opção. Será colaborar para o triunfo da tragédia. Por estes motivos, o argumento de que decisões judiciais se justificam sozinhas, por serem resultado da racionalidade, não é suficiente para a construção da democracia. Tampouco corresponde este argumento ao pluralismo democrático que uma constituição, como a brasileira, previu e impôs à sociedade. É necessário que seu conteúdo seja também resultante de processos democráticos previstos na constituição
O caso de Schmitt, com seus Escritos Escolhidos, serve para mostrar mais uma vez que o perigo da convivência da normalidade com o terror ameaça não somente constituição, democracia e leis: é a destruição do humano. É disso que se trata o desafio que ainda permanece atual.
Por suas decisões judiciais, pensam agir acima da realidade, e insistem em afirmar que decidem longe da mesma realidade que lhes bate às portas todos os dias. O cálculo político de Breyer revela exatamente que a mais elevada Corte dos EUA tanto é ideologicamente identificada, como é instrumento da luta político-partidária. Breyer sabe que a eleição de outubro para a renovação do Senado americano poderá ser fatal para o presidente Biden, que, já combalido, correrá o risco de sequer aprovar uma indicação sua para a Corte.
Tribunais nunca estão acima da política, embora quando reconheçam que deveriam ter agido a favor da democracia constitucional seja tarde demais. O ministro do STF Luís Roberto Barroso resolveu tornar público o que ele e seus colegas de Tribunal já sabiam: a destituição da presidenta Dilma Rousseff não passou de um golpe, contra ao qual o STF nada fez, quando foi chamado a intervir com base na sua jurisprudência desde 1992.
Na verdade, o ministro Barroso já havia afirmado em 2018 algo semelhante. Em julho de 2021, o mesmo ministro disse "que não deve haver dúvida razoável de que ela não foi afastada por crimes de responsabilidade ou corrupção, mas sim foi afastada por perda de sustentação política".
Tribunais politizados não significam partidarizados. Mas significam o aberto reconhecimento de que a escolha política democrática constituinte é a escolha do Tribunal. O Tribunal não será neutro, já que ninguém sobre a Terra o é. Mas tem a obrigação de ser imparcial. A fingida ignorância sobre a realidade nunca ajudou a construir democracias, nem no Brasil, nem em canto nenhum do mundo: ajudou a destruí-las. É a lição que remanesce
As relações da Rússia com a Europa estão num dos centros deste debate. De Bismarck aos sociais-democratas do começo dos anos 70 sempre houve vozes autorizadas, como de Egon Bahr, a insistirem que as relações entre estes dois não devem servir de vassalagem aos Estados Unidos. A Rússia czarista não é contemporânea dos impérios coloniais ocidentais como Portugal, Espanha dos Habsburgos, Holanda, Inglaterra e França. Sua tardia consolidação somente se concluiu com Pedro e Catarina, advertidos pela necessidade de modernização de suas elites militares e de nobreza. Com a União Soviética, a radicalização das artes, ciências, cultura e esporte tornou-a um estado essencialmente moderno a todas as camadas sociais. Insuspeitos, John Steinbeck e Robert Capa escreveram “Um Diário Russo”, a relatarem viagem à União Soviética entre julho e setembro de 1947: os soviéticos mostram a seus visitantes museus e teatros como os ocidentais exibem igrejas.
Desde os diálogos entre Gorbatchev e então líderes ocidentais em 1989, a atual Rússia recebeu garantias que a OTAN não se expandiria além da “linha vermelha”: Bielorrússia, Ucrânia e Moldávia. Os documentos revelados pelo National Security Archive no final de 2021 revelam o quanto tal promessa foi reiteradamente descumprida. Há quem diga que tal promessa jamais foi acertada. Ocorre que os mesmos documentos registram a insistência de Gorbatchev: somente será possível a reunificação alemã com garantias da não expansão da OTAN além de uma Alemanha reunificada.
A crise da Ucrânia se agrava há mais tempo. De verdadeira aliada dos nazistas na II Guerra, a Ucrânia foi ocupada pela União Soviética como espaço estratégico contra a OTAN. Derrubado o governo pró-Moscou de Viktor Yanukovycth em 2014, o Ocidente instalou governo que lhe era simpático de Petro Poroschenko. A cena da atual subsecretária de Estado Victoria Nuland, a distribuir pão na praça central de Kiev para os opositores de Yanukovytch, não deixa dúvida quanto o envolvimento direto dos EUA no episódio. Da mesma forma, a democracia liberal ocidental ignorou a presença de neonazistas e supremacistas no novo governo ucraniano pró-ocidente, o “Setor Direita”. O mesmo Ocidente não contava com a reação da Rússia da rápida ocupação da Crimeia. Modernizada em seu aparato militar, óbvio que Moscou não aceitará armas da OTAN às suas portas. Que país do mundo aceitaria tropas que lhe são hostis estacionadas na sua vizinhança? China e Rússia possuem porta-aviões no Caribe?
O que se assiste é o fracasso de previsões mundiais presentes desde o 1945. De C. Kindleberger e R. Gilpin até R. Aron, nos anos 90, todos afirmaram que, finada a União Soviética, seria necessária e positiva uma única potência liberal a mediar e resolver todos os conflitos da ordem mundial, em nome da paz. Não foi o que se viu. Nunca os EUA e a Europa se viram tão envolvidos em guerras como nos últimos 15 anos. O filósofo alemão Georg Lichtenberg anotou que havia um fermento na França em 1789: a dúvida era se se teria vinho ou vinagre. A história provou que veio o bom vinho. Atualmente, a mesma dúvida permanece para o conflito que se anuncia. E não parece que teremos vinho.
Parece ser autorizada uma conclusão inicial. Mesmo sob o risco de contaminação pelo vírus da COVID, a oposição ao presidente do Brasil se dispôs a confirmar o que muitas pesquisas já indicavam: há uma grande insatisfação com o governante brasileiro, e as chances de derrota em 2022 crescem a cada dia. O desafio de sempre retorna para a esquerda e centro-esquerda nacionais, isto é, o que fazer agora?
Todos sabemos que Bolsonaro está longe ainda de ser um candidato derrotado. Uma das apostas de Bolsonaro para permanecer no cargo que hoje ocupa é fora da institucionalidade. Além das ruas, cada vez com mais coesão e firmeza, os atores políticos brasileiros devem deixar claro que não haverá espaço para golpismo. Eis uma tarefa que exigirá muito dos progressistas.
contemporâneo
JUAREZ GUIMARÃES; MARCELO ANDRADE CATTONI DE OLIVEIRA; MARTONIO MONT’ALVERNE BARRETO LIMA; NEWTON DE MENEZES ALBUQUERQUE (organizadores).
São Paulo : Editora Fundação Perseu Abramo, 2016.
dos últimos 15 anos da América do Sul. Neste continente, as mudanças de constituições e de governos foram caracterizadas pela forte transformação a partir de reflexões a considerarem suas próprias realidades socioeconômicas. Se
for verdade que a influência do pensamento constitucional e político, de matrizes europeia e norte-americana, sempre foi dominante na América Latina, por outro lado há que se reconhecer que formulações originais surgiram em diversos países sul-americanos como produto de suas experiências. Para grande parte da crítica conservadora, a rotulação de constituições e governos populistas desautorizariam maior potência investigativa e original de tais pensamentos, o que
igualmente comprometeria a qualidade, como um todo, de tais experiências genuinamente sul-americanas. Ora, na esteira de Ernesto Laclau, é o populismo um fenômeno de qualquer regime: direita, esquerda; conservador ou progressista.
Visto sob este prisma, o populismo não há de ser avaliado necessariamente como negativo, especialmente pela histórica objetividade de que foi com o populismo, na América do Sul, que as reivindicações dos pobres vieram pela primeira vez para a agenda de governos. Não por acaso, concluímos no Brasil a República Velha com a conhecida frase de seu último presidente, Washington Luís, de que “no Brasil, a questão social é questão de polícia”. Ao dispensar tratamento legislativo à questão social, Getúlio Vargas, Juan Perón e Haya de La Torre proporcionam outra versão do populismo, bastante distinta daquela, por
exemplo, do francês General Boulanger e seu efêmero governo iniciado em janeiro de 1889.
O surgimento de um “constitucionalismo emancipatório”, como novas territorialidades (espaços comunais) e formas de organização do poder político,
nas palavras da recente tese de Heiner Fechner defendida na Universidade de Bremen (Emanzipatorischer Konstitutionalismus), fortalece a noção de que a América Latina tem-se constituído como espaço da construção do novo no âmbito do Direito Constitucional e que seus intelectuais são capazes de pensamentos originais, e não simples reproduções. Na verdade, essa possibilidade
já se constata há muito tempo. O detalhe é que agora ela desperta, pensamos, com inegáveis força e substância teóricas.
Assim, a presente obra organiza-se em dois grandes pontos: aquele da jurisdição constitucional no ambiente politicamente acirrado; e um outro a analisar as tensões judiciais e políticas provocadas por tal acirramento. Com inteira razão, muitos analistas da Ciência Política, diversos cientistas sociais e historiadores chamam a atenção do papel do Poder Judiciário nas sociedades
marcadas por desigualdades estruturais como o Brasil. Não surpreende que mesmo uma tentativa conjuntural de modificação dessa desigualdade encontre resistências em setores do Estado e da sociedade. É aqui que o papel do Poder Judiciário – e da burocracia judicial – destaca-se e, quase sempre, na perspectiva
de bloquear essas tentativas de natureza conjuntural, e não estrutural.
Portanto, no presente livro, o desdobramento da observação do protagonismo do Poder Judiciário mereceu atenção em duas vertentes: as transformações operadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro em casos emblemáticos, como a judicialização da saúde e das políticas públicas, a decisão sobre uniões homoafetivas, as queimadas de canaviais, o financiamento público das
campanhas políticas e a compreensão dos direitos humanos no direito internacional.
Nessa vertente da jurisdição constitucional, ainda é discutida a possibilidade do controle das chamadas questões políticas administrativas e legislativas pelo Poder Judiciário: há ensaios sobre a liberdade de cátedra universitária, o processo legislativo (emendas aglutinativas), a regulação democrática da mídia e a agenda conservadora da atual legislatura brasileira.
Em outra vertente, temos estudos sobre o Poder Judiciário e de seus nexos com a sociedade. O destaque aqui decorre da observação sobre o papel
do Poder Judiciário nas sociedades da América do Sul que experimentaram os chamados “governos populistas” (usa-se o termo com as rápidas ressalvas
igualmente mencionadas anteriormente!). Aliado fundamental da estrutural e histórica desigualdade no continente, o poder da informação revestiu-se de
elemento central para visão dos governantes, dos governos e dos governados, diferente da que tinham de si mesmos... ou da que imaginavam ter de si mesmos.
Não é da ausência de informação que sofrem as sociedades da América do Sul, como nos tempos das ditaduras militares. Sem que se saiba qual delas é
a mais nociva, compartilhamos as palavras de Wanderley Guilherme dos Santos de que o mal a afligir essas sociedades é a informação caolha, trocada, falsificada.
Em outras palavras: a informação monopolizada por apenas um dos lados da disputa política produz o risco do regresso da democracia, ainda a ser consolidada. O que aparentemente se reivindica como radicalidade da liberdade de imprensa, de livre manifestação do pensamento, consiste exatamente
no seu oposto: na liberdade de manifestação de apenas um pensamento, de apenas um dos segmentos do debate político, com interesses claros de enfrentar
qualquer ameaça ao seu monopólio informativo e à sua privilegiada posição dentro das classes sociais. Na esteira dessa colocação, reflexões mais que
oportunas são conduzidas aqui, sobre casos judiciais de combate à corrupção e seus vínculos com a imprensa, bem como a seletividade das informações se
expõe. Notamos que essa realidade não se concretiza somente no Brasil. Salta aos olhos a repetição – sempre contraditória, jamais linear – desses mecanismos constitucional, jurídico e político em outros países sul-americanos. Assim é que os escritos sobre a Operação Lava Jato, sobre corrupção de democracia e ainda sobre o pretorianismo midiático fecham o volume, a circunscrever, sob nossa ótica, um arco de reflexões que certamente serão somente as primeiras de outras que se seguirão.
Nestes anos nos quais a democracia brasileira está lidando pela primeira vez e frontalmente com os fenômenos da corrupção instalada no sistema político
em sua relação com os grandes grupos econômicos, a sua legitimidade, o equilíbrio constitucional e o devido processo legal estão sendo testados em seus limites. Este livro toma partido claramente do caminho democrático e republicano no combate à corrupção, que puna com rigor preservando os direitos legítimos dos processados e condenados, que garanta a publicidade democrática ao invés do uso manipulado e seletivo de informações, que garanta a imparcialidade e o universalismo dos atos, em detrimento de seus usos partidários ou instrumentais, que, enfim, combata a corrupção através do aprofundamento da consciência republicana e dos métodos de controle democrático, do aperfeiçoamento institucional, dos procedimentos e leis, da superação da impunidade Evidente que não se tem a intenção de esgotamento das temáticas com
esta publicação. Por outro lado, arriscamos a certeza de que as provocações lançadas contribuem para que se discuta o outro lado da política nacional, determinante para a qualidade da jovem democracia brasileira.