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Maria Beatriz Nascimento

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Maria Beatriz do Nascimento
Maria Beatriz Nascimento
Autor. Título da Fotografia [Maria Beatriz Nascimento]. Acervo indefinido.
Conhecido(a) por
  • ativista pelos direitos humanos de negros e mulheres
  • pesquisadora do protagonismo negro no meio acadêmico
Nascimento 12 de julho de 1942
Aracaju, Sergipe, Brasil
Morte 28 de janeiro de 1995 (52 anos)
Rio de Janeiro, Brasil
Residência Brasil
Nacionalidade brasileira
Alma mater Universidade Federal do Rio de Janeiro
Prêmios Mulher do Ano 1986, pelo Conselho Nacional dos Direitos da Mulher
Orientador(es)(as) Muniz Sodré
Campo(s) História e magistério
Tese Ori (1989)

Maria Beatriz Nascimento (Aracaju, 12 de julho de 1942Rio de Janeiro, 28 de janeiro de 1995) foi uma brasileira historiadora, professora, roteirista, poeta e ativista pelos direitos humanos de negros e mulheres.[1]

Nascida em Sergipe, migrou com a família para a cidade do Rio de Janeiro, onde formou-se em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, (UFRJ) especializou-se na Universidade Federal Fluminense (UFF) e fez parte do corpo discente do curso de mestrado em Comunicação Social da UFRJ.

Tornou-se influente nos estudos das relações raciais no Brasil após sua notoriedade em organizações acadêmicas do movimento negro. Suas obras mais notórias são o documentário Ori (1989) e artigos sobre o conceito de quilombo na História, raça, racismo e sexismo.[2]

Maria Beatriz nasceu em Aracaju, em 1942[1]. Seus pais eram a dona de casa Rubina Pereira do Nascimento e o pedreiro Francisco Xavier do Nascimento, que tiveram dez filhos, sendo a segunda filha mais nova. Com apenas 7 anos, migrou com a família para a cidade do Rio de Janeiro, no final de 1949, em uma viagem de barco, partindo de Salvador, instalando em Cordovil, Zona da Leopoldina[1]. Entre 1968 e 1971, cursa História na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Fez estágio em pesquisa no Arquivo Nacional, sob orientação do historiador José Honório Rodrigues e ingressa na rede estadual de ensino do Rio de Janeiro, lecionando história na escola estadual Roma, em Copacabana[3].

Em 1978, inicia pós-graduação lato sensu em História, pela Universidade Federal Fluminense, concluindo em 1981, estudando sistemas alternativos organizados exclusivamente por negros, pesquisando de quilombos às favelas modernas[4].

Movimento negro

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Já formada e lecionando na rede estadual, Maria Beatriz começou sua militância, participando e propondo discussões raciais[5], em especial no meio acadêmico. Ajudou a criar o Grupo de Trabalho André Rebouças, em 1974, na Universidade Federal Fluminense (UFF), e o Instituto de Pesquisa das Culturas Negras, em 1975[1][6]. Participou como conferencista de diversos encontros, conferências e simpósios[7], falando sobre seus incômodos quanto ao espaço universitário falar do negro apenas como o escravo, como se as pessoas negras tivessem participado da história apenas como mão-de-obra compulsória e sem direito à escolha[1][6][8]. Participou da Quinzena do Negro, em outubro de 1977, na Universidade de São Paulo, apresentando trabalho relacionado à questão étnico-racial, em especial dos quilombos[1]. Esteve duas vezes na África, com o intuito de conhecer parte do continente. Dentre essas vezes esteve em Angola, para conhecer os territórios dos antigos quilombos angolanos[1]. A universidade era seu lugar privilegiado de atuação Esta era a sua militância, e foi também o seu dilema.[9]. A encruzilhada entre a academia e o movimento social se manteve durante toda a trajetória de Beatriz, que também apontava os limites do pensamento acadêmico, no horizonte da sua dinâmica de produção colonial, indicando as possibilidades de uma história da gente negra.[10]

Em 1995, Maria Beatriz cursava mestrado em Comunicação Social[3][11], pela UFRJ e tinha aconselhado sua amiga, Áurea, a largar o companheiro, Antônio Jorge Amorim Viana, após várias reclamações de violência doméstica[12]. Em 28 de janeiro daquele ano, ele deu cinco tiros em Maria Beatriz, por entender que ela interferia em sua vida privada e o teria ofendido, chamando-o de "bicha" em frente a seus amigos.[13] Antônio fugiu e acabou sendo preso em um bar pela polícia civil em 9 de fevereiro de 1995. Antônio já tinha passagem pela polícia por acusações de homicídio, tentativa de estupro e uso de drogas, pelas quais já cumpria pena de 11 anos e seis meses[11][14].

Antônio disse à polícia que o assassinato da professora se deu depois de consumo de bebida alcoólica e remédios para dor de estômago e ele não reagiu à prisão[3]. Em 19 de abril de 1996, Antônio foi condenado a 17 anos de prisão pela morte de Maria Beatriz. A amiga de Beatriz e namorada de Vianna, Áurea Gurgel da Silveira, também foi acusada, por prestar falso testemunho ao tentar manchar a imagem de Beatriz perante o júri dizendo que a pesquisadora aliciava menores e fazia orgias[14].

Maria Beatriz tinha 52 anos e foi sepultada no Cemitério São João Batista, com a presença da família, amigos e militantes do movimento negro. Divorciada, ela deixou uma filha,[11] Bethânia Nascimento Freitas Gomes, bailarina no Dance Theatre of Harlem, em Nova Iorque, e quem escreveu a Apresentação do livro Beatriz Nascimento, quilombola e intelectual: possibilidade nos dias da destruição.[15]

O trabalho de maior reconhecimento de Maria Beatriz é o filme e documentário Ori (1989), de sua narração, de autoria e direção da socióloga e cineasta Raquel Gerber. Ele documenta a trajetória dos movimentos negros no Brasil entre 1977 e 1988, sendo o quilombo a ideia central e em parte a trajetória da própria Maria Beatriz[1]. Abordou temas como corporeidade do negro, a perda da imagem que atingia africanas e africanos escravizados e seus descendentes em diáspora e a situação das mulheres negras no Brasil, analisando sua condição social inferior devida ao amálgama de heranças escravistas com mecanismos racistas[1][5][8].

A intelectual apresentava, em suas obras, a experiência da população negra, especialmente das mulheres, no Brasil. No ensaio Meu negro interno,[16] buscou compreender a opressão sofrida pelas pessoas negras por meio da psicanálise.[17] Em busca de respostas para o sofrimento psíquico que sentia, consultou um analista, o qual sugeriu que havia uma força opressora, como se fosse um desdobramento da própria pensadora, que reproduzia o racismo no seu interior.[18] Beatriz Nascimento refutou essa ideia no ensaio e manteve-se na busca pela resposta que explicasse o abismo social provocado pelo racismo no Brasil.[19]

Trabalhos importantes publicados em revistas e periódicos:

  • "Por uma história do homem negro", Revista de Cultura Vozes. 68(1), pp. 41–45, 1974.
  • "Negro e racismo", Revista de Cultura Vozes. 68 (7), pp. 65–68, Petrópolis, 1974
  • "A mulher negra no mercado de trabalho", Jornal Última Hora, Rio de Janeiro, domingo, 25 de julho de 1976.
  • "Nossa democracia racial", Revista IstoÉ. 23 de novembro de 1977, pp. 48–49
  • "Kilombo e memória comunitária: um estudo de caso", Estudos Afro-Asiáticos 6-7. Rio de Janeiro, CEAA/UCAM, pp. 259–265. 1982.
  • "O conceito de quilombo e a resistência cultural negra", Afrodiáspora Nos. 6-7, pp. 41–49. 1985.
  • "Daquilo que se chama cultura", Jornal IDE. No. 12. Sociedade Brasileira de Psicanálise – São Paulo. Dezembro, 1986, p. 8.
  • "O quilombo do Jabaquara". Revista de Cultura, Vozes (maio-junho).
  • "A mulher negra e o amor", Jornal Maioria Falante, Nº 17, Fev – março, 1990, p. 3.
  • "O negro visto por ele mesmo – Ensaios, entrevistas e prosa". São Paulo: Ubu Editora, 2022. (Publicação póstuma, reunião de material anteriormente publicado e textos inéditos)[20].

Referências

  1. a b c d e f g h i Imprensa Oficial do Estado de São Paulo (ed.). «Eu Sou Atlântica» (PDF). Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. Consultado em 22 de julho de 2017 
  2. Junior, Humberto (31 de março de 2017). Humberto Júnior, ed. «MARIA BEATRIZ NASCIMENTO». Blog Habeas Mentem. Habeas Mentem. Consultado em 23 de março de 2024 
  3. a b c Folha de S.Paulo (ed.). «Acusado de matar professora é preso no Rio». Folha de S.Paulo. Consultado em 22 de julho de 2017 
  4. Black Women of Brazil (ed.). «Maria Beatriz Nascimento (1942-1995): Intellectual militant of the Movimento Negro, poet and historian of quilombos, Brazil's runaway slave societies». Black Women of Brazil. Consultado em 22 de julho de 2017. Arquivado do original em 26 de setembro de 2017 
  5. a b Alex Ratts (ed.). «A trajetória intelectual ativista de Beatriz Nascimento». Instituto Geledés. Consultado em 22 de julho de 2017 
  6. a b Mulher 500 Anos (ed.). «Maria Beatriz Nascimento (1942-1995)». Mulher 500 Anos. Consultado em 22 de julho de 2017. Arquivado do original em 16 de janeiro de 2014 
  7. Acorda Cultura (ed.). «MARIA BEATRIZ DO NASCIMENTO (1942 – 1995)». Acorda Cultura. Consultado em 22 de julho de 2017 
  8. a b Stephanie Ribeiro (ed.). «15 ARTISTAS NEGRAS QUE VOCÊ PRECISA CONHECER». Confeitaria. Consultado em 22 de julho de 2017 
  9. BATISTA, Wagner (10 de maio de 2018). «Palavras Sobre uma Historiadora Transatlântica: estudo da trajetória Intelectual de Maria Beatriz do Nascimento». Repositório da UFBA 
  10. MIRANDA, Janira (16/01/ 2023). «INTELECTUAL NEGRA NA HISTÓRIA ATLÂNTICA: O PROJETO HISTORIOGRÁFICO DE BEATRIZ NASCIMENTO». Editora da PUC Goiás. Revista Mosaico (Volume 16 No. 01, 2023): 95-107. Consultado em 12/11/2024.  Verifique data em: |acessodata=, |data= (ajuda)
  11. a b c Folha de S.Paulo (ed.). «Professora pode ter sido morta por racismo». Folha de S.Paulo. Consultado em 22 de julho de 2017 
  12. Hortensia Hernandez (ed.). «Maria Beatriz do Nascimento activista por los derechos humanos». Heroinas.net. Consultado em 22 de julho de 2017 
  13. «Cientista social morta dentro de bar, no Rio» (PDF). Diário da Manhã (2700). 30 de janeiro de 1995 
  14. a b Folha de S.Paulo (ed.). «Assassino de historiadora pega 17 anos». Folha de S.Paulo. Consultado em 22 de julho de 2017 
  15. NASCIMENTO, Beatriz (2018). Beatriz Nascimento, quilombola e intelectual: possibilidade nos dias da destruição. [S.l.]: Filhos da África. p. 18-20 
  16. NASCIMENTO, Beatriz. «Meu negro interno» (PDF). Consultado em 8 de novembro de 2024 
  17. NASCIMENTO, Beatriz (2018). Beatriz Nascimento, quilombola e intelectual: possibilidade os dias da destruição. [S.l.]: Filhos da África. p. 239 
  18. NASCIMENTO, Beatriz (2018). Beatriz Nascimento, quilombola e intelectual: possibilidade nos dias da destruição. [S.l.]: Filhos da África. p. 239 
  19. NASCIMENTO, Beatriz. «Meu negro interno» (PDF). Consultado em 8 de novembro de 2024 
  20. «O negro visto por ele mesmo – Ensaios, entrevistas e prosa». www.ubueditora.com.br. Consultado em 17 de outubro de 2023