Crise hídrica e debate público
sobre saneamento
Suyá Quintslr 1, IPPUR/UFRJ,
[email protected]
1
Doutoranda em Planejamento Urbano e Regional (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional – IPPUR/UFRJ).
A autora agradece à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e à Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) pelas bolsas concedidas entre os anos de 2014 e 2016.
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RESUMO
O presente artigo tem como objetivo compreender o debate público sobre o acesso à água no Rio
de Janeiro a partir da abordagem da contentious politics (McAdam, Tarrow & Tilly, 2009; Tarrow;
2009; Tilly, 1999) e da frame perspective (Snow, 2001). A situação atual, marcada, por um lado,
por amplo debate sobre a “crise hídrica” e, por outro, pelo “silenciamento” dos movimentos
sociais, é confrontada com a intensa mobilização da década de 1980 – quando se formou o Comitê
de Saneamento da Baixada Fluminense – com o objetivo de compreender como ocorrem os
processos de mobilização e desmobilização em torno do tema. A pesquisa é baseada em
entrevistas com lideranças, observação de debates públicos sobre a crise hídrica no RJ e um
levantamento de notícias veiculadas sobre a crise na mídia regional. Como resultado é possível
apontar diversas mudanças na estrutura política e na dinâmica dos movimentos sociais que
influenciaram os processos de mobilização/desmobilização. Além disso, questiona-se o papel da
“crise hídrica” na construção do consenso em torno da visão de que o problema de acesso à água
seria principalmente quantitativo, em detrimento da desigualdade espacial no acesso. Por fim, a
persistência de formas de resistência cotidiana (Scott, 2002) em uma situação de grande
desigualdade estrutural é ilustrada a partir do exemplo de Campos Elíseos (Duque de Caxias, RJ),
onde os moradores encontraram formas não convencionais de garantir seu acesso à água.
Palavras Chave: Crise hídrica; acesso à água; saneamento; ação coletiva.
RESUME
L’objectif de cet article est de réfléchir sur les conditions de la mobilisation à partir de l’approche
de la contentious politics (McAdam, Tarrow & Tilly, 2009; Tarrow; 2009; Tilly, 1999) et de la frame
perspective (Snow, 2001). Il s’agit de mieux comprendre les processus de mobilisation et de
démobilisation autour du thème de l’accès à l’eau, en confrontant la situation actuelle –
caractérisée d'un côté, pour le débat sur la « crise de l'eau » et, d'autre côté, par le silence des
mouvements sociaux – à l’ intense mobilisation des années 1980, où le « Comité d'assainissement
de la Baixada Fluminense » a été crée. La recherche repose sur l’observation des débats publiques
sur la crise de l’eau et sur entretiens menées avec dirigeants. Il est possible d’indiquer plusieurs
changements dans la structure politique et la dynamique des mouvements sociaux qui ont
influencé les processus de mobilisation / démobilisation. En outre, le rôle de la crise de l’eau est
mis en question comme forme de bâtir un consensus autour de l’avis de que le problème de l’eau
est davantage quantitatif, au dépit de la question de l’innegalité de l’accès. Finalement, l’existence
des formes de résistance quotidienne (Scott, 2002) dans une situation de grande inégalité
structurelle est illustrée par l'exemple de Campos Elíseos (Duque de Caxias, RJ), où les résidents
ont trouvé des moyens non conventionnels pour garantir leur accès à l'eau.
Mots-clés: crise d l’eau; accès à l’eau; assainissement; action collective.
DESENVOLVIMENTO, CRISE E RESISTÊNCIA: QUAIS OS CAMINHOS DO PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL?
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INTRODUÇÃO
Em 2014 e 2015 um período de seca prolongada no Sudeste do Brasil levou ao esgotamento das
reservas de diversos sistemas abastecimento de água em São Paulo e afetou, em certa medida,
também o sistema hidráulico do rio Paraíba do Sul, do qual depende o abastecimento de milhões
de pessoas no estado do Rio de Janeiro. Entretanto, o problema de acesso à água neste estado vai
muito além da disponibilidade hídrica, incluindo diversas áreas urbanas sem rede de distribuição,
bairros onde há forte intermitência no abastecimento e problemas de qualidade da água que
levam à interrupção do serviço, em especial na periferia metropolitana (Britto et al., 2014).
Ademais, processo histórico de segregação espacial no Rio de Janeiro e a insuficiente atuação do
poder público na promoção de políticas de saneamento na Baixada Fluminense, resultaram em
acentuada desigualdade no acesso à água entre o Rio de Janeiro e sua periferia. Entretanto, no
final da década de 1970 e ao longo da década de 1980 houve ao menos algumas tentativas de
reduzir o déficit de abastecimento nessa região. Esse momento coincide com o período de
emergência de uma série de movimentos sociais urbanos, alguns dos quais descritos por Eder
Sader (2001).
Na Baixada Fluminense, merece destaque a grande mobilização ocorrida na década de 1980 em
torno da criação do Comitê Político de Saneamento, Habitação e Meio Ambiente da Baixada
Fluminense. O Comitê foi uma esfera que englobou as federações de associações de moradores
dos municípios da Baixada Fluminense, compostas, por sua vez, pelos movimentos de bairros, e
consolidou-se por mais de uma década como um interlocutor privilegiado do Estado no que dizia
respeito às políticas de saneamento para a região. Em síntese, foi capaz de criar um espaço onde
os diversos problemas vividos cotidiana e localmente pelos moradores pudessem ser articulados
como uma questão pública que demandava soluções em termos de políticas específicas para a
região por parte dos poderes públicos responsáveis ou, nos termos de Cefaï (1996; 2008; 2009;
2012), uma arena pública.
Aqui, o recurso ao estudo de um movimento da década de 1980 tem o objetivo de contribuir com
a compreensão da situação contemporânea da mobilização em torno do saneamento, sendo esta
caracterizada, por um lado, por uma aparente imobilidade dos movimentos sociais; e, por outro,
pela construção social da crise hídrica no Rio de Janeiro. De certa forma, o enquadramento da
questão hídrica enquanto crise causa certa surpresa, uma vez que ela foi assim formulada devido
ao temor de que haja um racionamento de água na cidade do Rio de Janeiro nos moldes do
proposto para a metrópole paulista, que também vem enfrentando problemas de escassez. O
racionamento, segundo o esquema proposto para São Paulo, se materializaria na forma de rodízio,
ou seja, recebimento de água restrito a um determinado número de dias por semana ou a um
determinado número de horas por dia. Não obstante, o rodízio de abastecimento é a regra para
diversas áreas da periferia metropolitana e, sobretudo, para a Baixada Fluminense, onde,
dependendo do bairro, é possível passar vários dias seguidos sem receber água. Ademais, em
casos extremos, há bairros inteiros sem rede de abastecimento, ou seja, sem a possibilidade de
receber uma gota de água do serviço público.
Assim, busca-se entender os processos de mobilização e desmobilização à luz de pesquisadores da
ação coletiva, em especial aqueles vinculados à contentious politics (McAdam, Tarrow & Tilly,
2009; Tarrow; 2009; Tilly, 1999). O trabalho de significação e construção do sentido da ação
relacionada ao saneamento, ou “quadros de ação coletiva”, por sua vez, é interpretado à luz da
frame perspective (Snow, 2001). Além destes, considera-se importante para o tema aqui
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desenvolvido o trabalho de Bourdieu (2010) sobre a construção da “opinião pública” e de Scott
sobre as formas de resistência camponesa (2002).
Essa abordagem teórica é apresentada sucintamente na primeira seção. Em seguida, aborda-se a
constituição do Comitê de Saneamento. Sua descrição histórica é baseada: (i) no levantamento da
história do Comitê realizado por Porto (2003); (ii) nas entrevistas com lideranças da região
disponibilizadas no livro Sociedade em Movimento: trajetórias de participação social na Baixada
Fluminense (Macedo et al., 2007); (iii) em entrevistas realizadas com lideranças envolvidas
atualmente no debate sobre saneamento. Por fim, os novos contornos da questão da água na
metrópole – incluindo a emergência da crise hídrica e as formas de resistência locais – são
tratados na terceira seção. O debate em torno do atual enquadramento do problema de
abastecimento como crise é realizado a partir (i) das anotações de campo realizadas no decorrer
de diversos eventos que ocorreram ao longo do ano de 2015, incluindo sessões da Comissão
Parlamentar de Inquérito instalada na ALERJ para tratar do tema (CPI da Crise Hídrica); (ii) de um
levantamento não exaustivo das notícias veiculadas sobre a crise na imprensa; e (iii) de entrevistas
realizadas com lideranças populares e gestores públicos. A resistência local, finalmente, é ilustrada
a partir do estudo de caso de Campos Elíseos.
ABORDAGEM TEÓRICA: AÇÃO COLETIVA CONFRONTACIONAL, QUADROS DE AÇÃO
COLETIVA E RESISTÊNCIA COTIDIANA
Os autores vinculados à teoria da mobilização de recursos políticos, ao alargarem o alcance de
seus interesses – dos movimentos sociais propriamente ditos para toda forma de confronto
político (McAdam, Tarrow & Tilly, 2009; Tarrow; 2009; Tilly, 1999) – permitem estudar os
processos de mobilização e (aparente) desmobilização ao longo do tempo em torno da questão do
saneamento. Primeiramente, a inclusão da dimensão temporal e o conceito de ciclo de
reivindicações possibilita entender a intensidade das ações de confronto na década de 1980 e,
igualmente, os momentos de declínio na frequência das mesmas.
O conceito de movimento social aqui empregado foi formulado por estes teóricos em seu projeto
de “mapear o confronto político” (McAdam et al., 2009). Assim, os movimentos sociais são
compreendidos como uma interação social sustentada no tempo entre dominantes e dominados,
ou seja, entre partes que possuem uma acentuada desigualdade de poder (McAdam et al., 2009;
Tarrow, 2009).
A abordagem relacional adotada permite superar a oposição entre ação e estrutura, como nota
Bringel (2011). Nesse sentido, existe uma influência mútua entre as estruturas de oportunidades
políticas e a ação coletiva, podendo esta, no longo prazo, alterar as próprias estruturas de
oportunidades, que compreendem: (i) as formas de governo – que podem ser mais ou menos
autoritárias –; (ii) as formas de repressão; e (iii) a presença de aliados e/ou rivais potenciais.
De acordo com McAdam e colaboradores, as ações dos movimentos assumem a forma de
repertórios, os quais “são uma expressão da interação histórica e atual entre eles e seus
opositores” (McAdam et al., 2009, p.24). Dito de outra forma, as estruturas de oportunidades
influenciam e transformam os repertórios possíveis, seja através da repressão, da facilitação ou de
estratégias de controle social (Ibid.).
Outra questão importante na a análise dos movimentos é o processo de constituição de
identidades coletivas, que vai ao encontro da noção de quadro de ação coletiva, proposta por
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Snow (2001) com base na frame perspective inspirada em Goffman. Sua preocupação está
fortemente centrada na construção dos sentidos da ação coletiva, empreendida através do
“trabalho de significação” por parte de militantes ou outros participantes dos movimentos (Ibid.,
p.1):
os produtos desta atividade de enquadramento, na arena do movimento
social, são denominadas “quadros de ação coletiva”, definidos como “os
conjuntos de crenças e significados orientados para a ação, que inspiram e
legitimam as atividades e campanhas de segmentos organizacionais de um
movimento social”.
Na construção desses quadros, Snow (2001) e Tarrow (2009) consideram relevante a inscrição de
situações tidas como problemáticas em um quadro interpretativo mais amplo, onde elas apareçam
como situações de injustiça social que convidem à ação. Assim, novos elementos podem ser
articulados e certos aspectos amplificados de maneira criativa pelos movimentos que buscam
mobilizar o consenso, criar significados compartilhados e alargar seu espectro de ação. Ou seja, o
sentimento de injustiça não provocará de forma automática uma ação coletiva, podendo ser
necessária alguma forma de mediação, usualmente realizada pelas lideranças.
Cefaï (2008) reforça a análise relacional ao se afastar tanto do que ele considera como
racionalismo quanto do estruturalismo embutidos nas análises de quadros de ação coletiva. Assim,
rejeita o processo de enquadramento como uma ação meramente estratégica dos movimentos e
alega que as análises e propostas dos líderes “devem ter uma congruência semântica com a vida
cotidiana ou o universo político de seus destinatários” (p. 22), para que produzam alguma
ressonância e contribuam para a mobilização do consenso. Desta forma, critica, igualmente, o
excessivo psicologicismo de certas abordagens (Cefaï, 1996; Cefaï, 2008):
É insuficiente, em certo sentido, falar de “construção” da realidade ou da
legitimidade [...]: isso implica considerar que as questões cognitivas e
normativas dos problemas públicos são indefinidamente manipuláveis, que os
critérios de sua apreensão são arbitrários ou artificiais; abre margem a toda
forma de ceticismo e de cinismo (Cefaï, 1996, p.48).
O processo de construção da questão pública (arena pública) se dá, portanto, em um jogo de
enquadramentos e reenquadramentos sucessivos do problema público (Ibid.). Para o autor (2009,
p.27), uma mobilização deve “produzir os termos de sua inteligibilidade e de sua legitimidade para
os auditórios aos quais se endereça, para os membros que a compõem e para os adversários
contra os quais luta”, sendo uma ação coletiva, portanto, “uma arquitetura móvel de contextos de
sentidos [...] que articulam diferentes grandezas de escala espacial e temporal e que são
percebidos pelos atores como acessíveis a suas interações ou coercitivos [...]” (Ibid., p.28). O autor
destaca, por fim, uma questão que ele considera ter sido negligenciada pelas diversas correntes
teóricas: a importância da afetividade para a ação coletiva, fundamental, a seu ver, no processo de
produção da experiência perceptiva e moral: “O sentido do bem, do direito e da justiça, o sentido
da honra, a paixão pela igualdade ou ódio de classe são, antes de tudo, sentimentos morais. Toda
mobilização coletiva é pontuada por experiências de indignação e revolta, solidariedade ou
debandada, alegria ou decepção” (Ibid., p.31).
Estes elementos possibilitam fazer indagações sobre as diferentes formas de conceber a questão
do saneamento na metrópole e os enquadramentos da ação coletiva voltada para a exigência
desse serviço. Permitem problematizar, inclusive, o atual enquadramento da questão do
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abastecimento no estado enquanto crise hídrica. Entretanto, persiste ainda a questão de
compreender o que restou da mobilização em torno do saneamento na Baixada Fluminense.
O fato de não haver nenhum movimento tão pujante como o Comitê de Saneamento da década de
1980 não significa que alguns movimentos sociais não continuem denunciando as desigualdades
no acesso à água na região, como é o caso do Movimento Pró-Saneamento e Meio Ambiente da
Região do Parque Araruama, em São João de Meriti, e do Fórum dos Atingidos pela Indústria do
Petróleo nas Cercanias da Baía de Guanabara (FAPP-BG). Além do que, como destaca Scott (2002),
na aparente apatia dos grupos dominados, podem esconder-se “silenciosas guerrilhas” travadas
pela sobrevivência cotidiana, mas que têm o potencial de contestar e até mesmo alterar as
políticas do Estado.
De acordo com o proeminente cientista político e antropólogo americano, “entender essas formas
comuns de luta é entender o que muitos dos camponeses fazem nos períodos entre as revoltas
para melhor defender seus interesses” (Scott, 2002, p. 12). Essas “formas cotidianas de
resistência” são caracterizadas por requererem um baixo grau de organização e planejamento, por
representarem iniciativas individuais ou de pequenos grupos pela sobrevivência, por evitarem o
confronto com elites ou autoridades, e pelo fato de raramente os agentes reivindicarem a autoria
dos atos, uma vez que o anonimato é, na maioria das vezes, a garantia de sua segurança (Ibid.).
Podem ser, em um contexto de grande assimetria de poder e repressão, as únicas opções
disponíveis para os grupos desprovidos de outras formas de se fazer ouvir no espaço público.
Scott admite que seria errôneo supervalorizar tais formas de resistência, mas advoga sobre sua
significância em contextos de grande desvantagem estrutural: “[...] é dessa maneira e não através
de revoltas ou da pressão política legal que o campesinato tem classicamente marcado presença
na política” (Ibid., p. 13). Mesmo tendo o potencial de influenciar as políticas do Estado e as
relações de classe, estas ações são frequentemente negligenciadas pelos registros históricos em
decorrência da própria “natureza dos fatos” e da “mudez auto-interessada dos antagonistas”
(Ibid., p. 13-14). Se, por um lado, os agentes da resistência buscam não chamar atenção sobre suas
ações como forma de proteção, para o Estado admiti-las também acarreta algumas desvantagens,
tais como assumir a impopularidade de algumas políticas e a dureza de sua autoridade nestas
situações (Ibid.). Adicionalmente, como algumas formas cotidianas de resistência incluem
transgressões à lei, como os furtos de grãos de arroz estudados pelo autor e incêndios
premeditados ou sabotagem, reconhecê-las é, igualmente, um reconhecimento de ausência de
autoridade para fazer valer as normas por ele mesmo estabelecidas.
Dessa forma, a nosso ver, algumas das ações desenvolvidas atualmente por moradores na escala
local para garantir o acesso à água em um contexto de não prestação do serviço pelo poder
público podem ser interpretadas a partir do conceito de “formas cotidianas de resistência”. Essas
ações ganham relevância na medida em que a segregação na metrópole se aprofunda e, com ela, a
desigualdade de oportunidades de colocar os problemas vivenciados localmente na agenda
política.
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O COMITÊ DE SANEAMENTO DA BAIXADA FLUMINENSE
UMA SOCIEDADE EM MOVIMENTO? CONDIÇÕES PARA A POLITIZAÇÃO DA QUESTÃO DO SANEAMENTO
NA DÉCADA DE 1980
O Comitê Político de Saneamento da Baixada Fluminense surgiu no ano de 1984 no contexto da
reabertura política após 20 anos de ditadura militar no Brasil. As condições para a formação deste
movimento regional, entretanto, foram sendo gradativamente construídas ao longo das décadas
anteriores.
Na Baixada Fluminense, como em diversas outras regiões do país, os movimentos de bairro e
sindicais que existiam antes de 1964 foram, em um primeiro momento, desarticulados pelos
militares e pelo acirramento da repressão no final da década de 1960. A atividade das associações
de bairro na região no período anterior ao Golpe Militar (1964) pode ser atestada pela realização
do primeiro congresso de associações de moradores de que se tem registro no país, em 1960
(Amaral, 2001; Porto, 2003). Entretanto, a generalização de processos de cassação dos direitos
políticos a partir da promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5) resultou na desarticulação da
maior parte das associações de moradores e amigos de bairro e na perseguição e prisão de
diversas lideranças (Macedo et al., 2007). Este momento de endurecimento das formas de
repressão e autoritarismo levou a um declínio na frequência das reivindicações, o que é entendido
por Tarrow (2009) como parte dos ciclos de reivindicações. Apesar das limitações impostas pela
estrutura política, o contexto teve duas implicações que nos parecem fundamentais para a
rearticulação dos movimentos sociais na Baixada Fluminense na década de 1970, ainda em um
contexto de forte repressão.
Em primeiro lugar, militantes do movimento estudantil e de partidos políticos de esquerda
(principalmente PCdoB, PCB) se instalaram em municípios da região, seja fugindo da perseguição
política, seja buscando realizar trabalhos sociais na periferia. Um exemplo desta última motivação
é a chegada dos “quatro médicos” (Antônio Ivo, Lúcia Souto, Ana Leonor e José Noronha), citada
em diversas entrevistas transcritas por Macedo e colaboradores (2007). Nas palavras de uma das
médicas, a intenção dos quatro era “fazer um trabalho comunitário a partir da saúde” (Souto,
2007, p.32). A trajetória de outro estudante de medicina e militante do PCdoB, Nelson Quintela,
ilustra como a perseguição política levou estudantes a se instalarem na região. De acordo com
Dilcéia Quintela, com quem foi casado, apesar do desejo da família de que ele saísse do Brasil, ele
decidiu permanecer no país, tendo que atuar na clandestinidade, sendo obrigado a romper
vínculos com a família, largar a faculdade e mudar-se de Copacabana para a Baixada Fluminense
(Quintela, 2007, p. 24). A interação destes estudantes – em sua maioria de classe média e
advindos da capital – com lideranças da Baixada Fluminense resultou em novas configurações dos
movimentos que ainda resistiam na região. Uma questão que se tornou cada vez mais relevante
foi a relação entre saneamento e saúde. Os “encontros de saúde” promovidos pelos “quatro
médicos” em parceria com a Diocese de Nova Iguaçu também contribuíram para a fundação do
Movimento Amigos de Bairro (MAB), que deu origem à Federação das Associações de Moradores
de Nova Iguaçu (Quintela, 2007; Souto, 2007).
Em segundo lugar, a proibição de manifestações e encontros políticos resultou, como observa
Acselrad (2015, p. 64), em um “movimento permanente de destruição, em distintas escalas, de
arenas públicas emergentes”, restringindo a crítica política a espaços semi-públicos ou “espaços
públicos periféricos” (Lopes, 2008, p.131 apud Acselrad, 2015, p.61). No caso analisado, a Igreja
Católica constituiu-se em espaço privilegiado de resistência e mobilização política (Porto, 2003;
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Raulino, 2015; Machado, 2015; Silva, 2015), onde a construção de laços de confiança e afetividade,
cuja importância foi destacada por Cefaï (2009), contribuiu para a rearticulação da sociedade civil.
Praticamente todas as lideranças falaram da importância da Igreja e, em especial dos bispos Dom
Adriano Hypólito (Diocese de Nova Iguaçu, 1966 - 1994) e Dom Mauro Morelli (Diocese de Duque
de Caxias, 1981-2005) e do Padre Adelar, que atuou durante 30 anos na Baixada Fluminense.
Alguns dos entrevistados tiveram atuação diretamente vinculada à Igreja – nos grupos jovens,
Comunidades Eclesiais de Base e Pastorais –, outros, como os que vinham do movimento
estudantil e/ou sofriam perseguição política, foram abrigados e construíram suas redes de atuação
a partir do trabalho destes clérigos.
Cabe ressaltar aqui o fato de algumas lideranças comunitárias formadas politicamente pela Igreja
Católica não professarem esta mesma fé. Como exemplo, é possível citar o dirigente do MPS que,
apesar de ser da Igreja Batista, teve sua “formação política” vinculada à atuação de Padre Adelar
(Machado, 2015). Quintela (2007), por sua vez, cita outra liderança que, apesar de não ser uma
“católica ardorosa”, frequentava a Igreja por esta ser um espaço de encontro e articulação. De
acordo com Sebastião Bernardino de Andrade (2007, p.41):
A CNBB, nesse período, tinha a sua frente D. Ivo Locheider, e se intensificou
um compromisso com os pobres e com as classes populares, com uma busca
pela redemocratização do país e, discretamente, um embate contra a
ditadura. [...] Já que não podia ter reunião de sindicatos e aglomeração em
praças, a Igreja era um campo neutro para a organização das bases. 2
Tendo se constituído ao longo da segunda metade da década de 1960 e durante a década de 1970
como um dos poucos espaços onde era possível a realização de atividades de formação e
articulação política, a Igreja Católica acabou por desempenhar um papel importante na
constituição das Federações de Associações de Moradores. As articulações que possibilitaram o
surgimento do MAB, em 1981, ocorreram com participação da Diocese de Nova Iguaçu e a
primeira sala do movimento foi cedida pelo Centro de Formação de Líderes da Igreja (Quintela,
2007). A sede da Federação das Associações de Moradores de Duque de Caxias (MUB), no Pilar,
por sua vez, foi construída com recursos de uma entidade ligada à Missão Central Franciscana
Alemã (Andrade, 2007). A participação de Padre Adelar na formação da Federação de São João de
Meriti (ABM), em 1983, também foi ressaltada pelos entrevistados (Silva, 2007; Florêncio, 2007;
Machado, 2015; Raulino, 2015). Machado (2015) descreve a atuação do pároco:
A luta dele sempre foi por saneamento, por água. Ele vinha com a pregação
dele na Sexta-feira Santa, pegava aquela caminhada das 14 estações de Cristo,
chegava na beira de uma vala, parava a procissão e falava para as pessoas do
por quê aquela vala estar ali e porque ela não deveria estar ali. Então ele usava
a pregação dele sempre para esclarecer [...].
As interações descritas – entre movimento estudantil, militantes de partidos de esquerda e
moradores preocupados com suas condições de vida – mediadas por uma Igreja progressista e por
bispos e padres engajados possibilitaram o ressurgimento dos movimentos populares urbanos na
Baixada Fluminense na segunda metade da década de 1970. Como notado por Porto (2003, p.73),
o acirramento dos problemas urbanos contribuiu para a “emergência de um discurso sobre a
2
A maior parte dos clérigos citados nas entrevistas era ligada à Teologia da Libertação, corrente do catolicismo que surgiu
durante os estudos preparatórios da II Conferência Geral dos Bispos Latino-Americanos, realizada em Medellín, Colômbia,
em 1968 (Altmann, 2014). Destacam-se como preocupações da Teologia da Libertação a situação de opressão do povo na
América Latina, as situações de injustiça e a construção de uma sociedade mais justa e fraterna (Ibid.).
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Baixada Fluminense”. De acordo com o autor, este novo discurso realçava a Baixada Fluminense
como “lugar de moradia dos trabalhadores e da exploração de classe” (p. 63).
Assim, as associações de bairro começam, ainda na década de 1970, a debater as questões
relativas ao saneamento da região. Mutirões de limpeza de “valões” eram organizados e foi
estabelecida uma agenda que articulava saneamento e saúde a partir da influência dos médicos
sanitaristas, sendo as enchentes um tema recorrente.
Com o surgimento das federações de associações de moradores na década de 1980, e a formação
do Comitê de Saneamento, em 1984, o debate sofreu mais uma modificação importante, i.e., uma
mudança de escala. A articulação das entidades de bairro levou à constatação de que problemas
semelhantes eram vivenciados em toda a Baixada. Ademais, possibilitou a compreensão dos
problemas de drenagem, esgotamento e abastecimento de água em termos regionais, bem como
o entendimento de que eles não poderiam ser enfrentados de forma fragmentada. Este
reenquadramento dos problemas de saneamento em termos regionais fica claro no relato de uma
das fundadoras do MAB:
A Baixada é uma nesga de terra composta por Nova Iguaçu, Caxias, São João
[de Meriti], Nilópolis e Magé; há três grandes rios que cortam esses municípios
[...] Então limpar um rio aqui em Nova Iguaçu era bobagem, se eles não
limpam em Gramacho não resolve o problema. (Quintela, 2007, p.19)
Na verdade, a própria criação do Comitê é fruto desta nova compreensão mais integrada do
saneamento pelos movimentos populares. No início da década de 1980, frente à reincidência das
enchentes e a imobilidade do Estado, multiplicam-se as manifestações públicas reivindicando o
saneamento da região. O repertório do movimento incluiu passeatas, manifestações e tentativas
de encontro com o poder público, como relatado por suas lideranças. O jornal ABM nos Bairros
(ABM, 1988) descreve os episódios mais relevantes de 1984:
No dia 11 de novembro de 1984 [...] duas mil pessoas participaram de uma
passeata de Vilar dos Teles até o centro de São João. O próximo episódio
aconteceu sete dias depois em Nova Iguaçu. Cinco mil pessoas se reuniram
para, coordenados pela MAB (Nova Iguaçu), MUB (Caxias) e ABM e Famerj,
discutirem com o Governador o saneamento global da Baixada.
Como o Governador não apareceu, os moradores foram até ele dia 23 de
novembro, emocionando o centro da cidade numa passeata da Central do
Brasil até o Palácio Guanabara, que juntou duas mil pessoas num só grito: A
Baixada exige Saneamento Já!
De acordo com Florêncio (2007) esse processo culminou na formação do Comitê de Saneamento
no dia 23 de novembro de 1984, através de um acordo com o então Secretário de Obras do Estado
do Rio de Janeiro, Luiz Alfredo Salomão. Posteriormente, o Comitê alterou seu nome para
incorporar a questão da habitação e do meio ambiente, passando a ser denominado Comitê
Político de Saneamento, Habitação e Meio Ambiente da Baixada Fluminense.
A
TRAJETÓRIA DO COMITÊ DE SANEAMENTO: DAS GRANDES MOBILIZAÇÕES
REIVINDICANDO A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS À APARENTE DESMOBILIZAÇÃO E
DISPERSÃO
Conforme apresentado no item anterior, a formação do Comitê foi antecedida por uma série de
articulações locais, em geral representadas pela formação das associações de bairro nos
DESENVOLVIMENTO, CRISE E RESISTÊNCIA: QUAIS OS CAMINHOS DO PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL?
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municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias e São João de Meriti. 3 Gradualmente, os problemas
vivenciados no nível dos bairros passaram a ser identificados como sendo comuns a toda a Baixada
Fluminense, tendo contribuído para este processo a formação das federações de associações de
moradores. A intensificação das lutas destas organizações por saneamento e saúde no início da
década de 1980 teve como resultado a formação do Comitê de Saneamento (1984), que se
constituiu como um espaço de diálogo entre sociedade civil organizada e Estado.
Tal processo foi favorecido por uma mudança na estrutura política, representada principalmente
pela reabertura política. Leonel Brizola (PDT) tinha sido eleito governador no ano anterior (1983)
pelo voto popular, após quase 20 anos de interventores nomeados pelos militares. Na avaliação de
Porto (2003), com sua eleição, se estabelece na gestão da política de saneamento uma nova
burocracia estatal com um projeto de caráter reformista e orientada tanto para a universalização
dos serviços, quanto disposta a estabelecer canais de diálogo com a população.
O Comitê era composto por representantes das federações de associações de moradores e reuniase mensalmente com representantes do Estado – dependendo da questão a ser debatida,
participavam, além da Secretaria de Obras, CEDAE e Serla (hoje INEA) (Quintela, 2007; Silva, 2007).
Porto (2003) destaca que, inicialmente, a identidade do Comitê expressava uma ambiguidade: por
um lado, designava uma articulação dos movimentos populares na luta por saneamento; por
outro, tendo sido criado a partir de um acordo com o Secretário de Obras do Estado, significava o
espaço de encontro entre o poder público e a sociedade civil para debater as políticas de
saneamento da região. Tal ambiguidade será parcialmente resolvida, segundo o autor, no governo
Moreira Franco (1987-1991) (Ibid.). Uma vez que este governo não valorizava a esfera pública
estabelecida na gestão anterior, sua identidade passa a ser claramente marcada pela articulação
das federações da Baixada Fluminense.
A despeito desta dificuldade na delimitação de suas fronteiras identitárias, a possibilidade de
orientar as demandas do movimento popular para a esfera estadual apresentou, segundo as
fontes consultadas, inúmeras vantagens. Em primeiro lugar, como tratado anteriormente, já
existia o entendimento de que as questões de saneamento não seriam resolvidas no âmbito
municipal, tendo em vista o caráter regionalizado do problema. Em segundo lugar, a política de
saneamento no período dependia diretamente das Companhias Estaduais de Saneamento (Porto,
2003), fortalecidas durante o regime autoritário em detrimento da autonomia municipal. Por fim,
o diálogo com um governo que estava disposto a debater e incorporar as demandas das
associações possibilitava contornar o clientelismo fortemente arraigado na maneira de se fazer
política na região (Florêncio, 2007). Assim, diversas políticas públicas de saneamento foram
concebidas a partir desse diálogo. A primeira delas foi o Projeto Especial de Saneamento para
Baixada Fluminense e São Gonçalo (PEBS) (ABM, 1988; Porto, 2003; Florêncio, 2007).
O PEBS teve continuidade no governo Moreira Franco, que o restringiu ao componente
esgotamento sanitário e elaborou o Plano de Setorização do Abastecimento de Água, a ser
executado entre 1986 e 1990 (São João de Meriti, 2012). Segundo Porto (2003), apesar da menor
abertura à participação popular, foi mantido o diálogo com o Comitê em torno destes projetos.
Os estragos provocados pelas enchentes de 1988 abriram uma nova rodada de manifestações de
massa exigindo políticas de saneamento para a região. Dentre os protestos, Quintela (2007)
3
Belford Roxo, Mesquita e Queimados só se emanciparão de Nova Iguaçu na década de 1990.
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destaca a ida das federações à Brasília em 15 ônibus. Nesse período, o governo estadual elaborou
o Projeto Reconstrução Rio como resposta emergencial.
A abertura para a participação popular no segundo governo Brizola foi avaliada de diferentes
formas pelas lideranças. Quintela (2007), por exemplo, considera que este governo não teve a
“mesma pujança que o primeiro” e não deu tanto espaço aos movimentos populares. Porto
(2003), por sua vez, julga que a aliança com os movimentos foi retomada e destaca que dela
resultou, inclusive, a elaboração do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), que
englobava uma visão abrangente de saneamento.
É possível notar uma inflexão mais clara na relação do Governo do Estado com os movimentos
populares da Baixada Fluminense no final da década de 1990, durante os mandatos de Marcello
Alencar (1995-1999) e de Anthony Garotinho (1999-2002). Não há, entretanto, um consenso entre
as fontes consultadas sobre o momento preciso em que cessa o diálogo com o Comitê. Há, porém,
concordância de que a forma de participação e controle social propostas pela nova política
desenvolvida para a região, o Programa Nova Baixada (inicialmente denominado Baixada Viva)
esvaziou este espaço. No âmbito do programa foi prevista a criação de Comitês Gestores Locais,
para participação dos beneficiários diretos, sendo interrompido o diálogo com o Comitê de
Saneamento.
Em síntese, desde a criação do Comitê, houve avanços e recuos no grau de abertura do Estado à
participação popular nas políticas de saneamento para a Baixada Fluminense, até que no final da
década de 1990 ele foi esvaziado de seu conteúdo político. Embora o próprio Estado tenha o
poder de contribuir para a deslegitimação dos espaços de participação ao torná-los inócuos, cabe
indagar sobre que outros fatores tornaram isso possível sem que novas rodadas de manifestações
buscassem conter o processo.
Apesar de haver consenso entre as fontes consultadas sobre a disposição para o diálogo no
primeiro Governo Brizola, uma liderança do MAB considera que a aproximação entre governo e
movimentos populares teria contribuído para o enfraquecimento dos últimos devido à cooptação
de lideranças. Esta questão, que aparece de diferentes formas nos depoimentos, é problematizada
por Macedo e colaboradores (2007). Para os autores (Ibid., p. 153), o uso desta categoria para
expressar a ambiguidade entre “sociedade civil” e Estado assume “caráter acusatório” para ambas
as partes (“cooptadores” e cooptados) e demonstra a fragilidade conceitual da separação entre as
duas esferas: “Tradicionalmente concebidos pela literatura de ciência política como separados a
partir de situações em que estiveram, de algum modo, em oposição, estes conceitos perdem sua
funcionalidade em situações nas quais seus integrantes se confundem”.
De acordo com lideranças da região, as oscilações e a queda na participação social decorreram de
questões relacionadas tanto ao poder público quanto à sociedade civil. Em relação às restrições
impostas pelo Estado, foi relatado que os governos subsequentes (Moreira Franco, 1987-1991;
Leonel Brizola, 1991-1994; Marcelo Alencar, 1995-1999) não apresentaram a mesma abertura aos
movimentos, apesar da manutenção do funcionamento do Comitê (Quintela, 2007). Em relação ao
diálogo com o Governo de Anthony Garotinho, as críticas foram mais enfáticas:
[...] Quando entrou o Garotinho, desgraçou de vez a participação. [...] Ao
retirar o Comitê de Saneamento e as federações dessa discussão mais global, o
governo acabou fazendo uma qualidade de escuta pequena entre os bairros e
municípios. Ele não dialogava com a gente (Quintela, 2007, p.21-22).
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O governo conservador do Marcelo Alencar foi melhor para a sociedade. [...] O
Garotinho [...] vai lá e compra o movimento. [...] nesse governo Garotinho
houve muito desrespeito com a participação popular. Eles não recebem as
federações. [...] O que os governos Garotinho e Rosinha conseguiram trabalhar
muito bem foi o casamento perfeito entre o assistencialismo e o clientelismo
instalado na Baixada (Florêncio, 2007, p.128).
Em que pese o fato de a ausência do poder público nos espaços de diálogo ter o potencial de gerar
descrença em sua efetividade e resignação, outros motivos, vinculados ao contexto
socioeconômico e à própria dinâmica dos movimentos foram apontados para a desmobilização
verificada a partir dos anos 1990. Entre os primeiros, destaca-se a crise da década de 1980 e a
incorporação de aspectos da agenda neoliberal pelo Estado brasileiro que levaram à precarização
das relações de trabalho e ao empobrecimento da população (Quintela, 2007; David, 2007):
[...] tínhamos que trabalhar mais e sobrava cada vez menos tempo para se
dedicar ao movimento. O projeto neoliberal não é só econômico [...] é
ideológico [...]. Exacerbou o individualismo nas pessoas. (Quintela, p.21)
Não tem mais uma grande quantidade de trabalhadores de macacão indo para
a fábrica. Agora, está todo mundo terceirizado ou vivendo de biscates. Então,
o movimento sindical se enfraqueceu também. [...] O limite fundamental é
aquele das condições de vida. [...] as pessoas têm que correr atrás do ganha
pão de cada dia [...] para atuar é preciso tempo [...] (David, p. 83-85).
Além disto, o avanço da violência e do tráfico de drogas representaria um obstáculo adicional, ao
que se soma, atualmente, o medo das milícias (Machado, 2015).
Se, por um lado, os entrevistados apontam o empobrecimento, o aumento do individualismo e a
violência como motivos de desarticulação, por outro, aspectos avaliados por eles como positivos,
como a conquista de algumas das principais demandas, a redemocratização e a criação dos
conselhos gestores de políticas públicas, também são considerados motivos para o
enfraquecimento das lutas populares (David, 2007; Silva, 2007). Nesse sentido, após essas
conquistas no campo da democracia e de alguns poucos avanços em relação às condições de vida
da região, as pessoas teriam se acomodado e os movimentos se institucionalizado.
Por fim, uma política federal desenvolvida durante o Governo Sarney (1985-1990) no âmbito do
Programa de Suplementação Alimentar – o Tíquete do Leite – esteve, segundo lideranças, de
alguma forma, relacionada ao esvaziamento das associações. Uma liderança do MAB considera
que ela tenha exercido inicialmente um estímulo à participação, uma vez que atraía as famílias
para as reuniões onde, além da distribuição do tíquete, discutia-se política (Costa da Silva, 2007).
Entretanto, reconhece que, com o fim do benefício, o efeito foi inverso e as pessoas pararam de ir
às reuniões. Outra liderança se mostra mais crítica à forma de distribuição do tíquete:
Eu sabia que isso criaria um grande problema para o movimento popular. [...]
As associações iam todas muito bem, até que vieram os tíquetes do leite.
Imaginem a situação. Eu sou um líder comunitário, pobre, não tenho cargo e
não tenho nada, mas tenho 200 tíquetes de leite para distribuir. Veja o poder
que eu tenho no meu bairro! (Clemente da Silva, 2007)
Todas essas questões levantadas em entrevistas por lideranças parecem ter contribuído para
desenvolver uma descrença na política como forma de alterar as condições de vida por parte da
população, culminando em um quadro de quase ausência de ações reivindicatórias pelo acesso à
água e ao saneamento na Baixada Fluminense.
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OS NOVOS CONTORNOS DO PROBLEMA DA ÁGUA NA METRÓPOLE FLUMINENSE: CRISE
HÍDRICA E RISCO DIFUSO DE DESABASTECIMENTO VERSUS RESISTÊNCIA COTIDIANA
CRISE HÍDRICA NO RIO DE JANEIRO
A história da cidade e da Região Metropolitana do Rio de Janeiro foi marcada pela busca constante
por fontes de abastecimento de água. Uma rápida busca em registros históricos é suficiente para
atestar as inúmeras “crises”, “eventos críticos”, “situações de calamidade” pelas quais a região
passou em decorrência da falta de água (Amarante, 1941). Estas situações pareceram ter ficado
para trás com o início do uso das águas do Guandu nos anos 1950, possibilitado pela transposição
do Rio Paraíba do Sul. Todavia, em 2014-2015, o sudeste passou por um período de forte estiagem
e novamente o termo crise foi amplamente empregado para designar a situação. Entretanto, a
propagada “crise hídrica do Sudeste” engloba situações muito distintas. Em um extremo é possível
situar a macro metrópole paulista, que já sofre com os efeitos da seca desde o ano de 2014,
quando sucessivamente os seus reservatórios foram sendo esgotados, não apenas pela falta de
chuvas, mas também pela má gestão da concessionária. O município de Itu foi palco de alguns dos
episódios mais dramáticos, quando, ao ficarem 15 dias sem água, os moradores iniciaram
protestos e saques a caminhões-pipa, que começaram a fazer a distribuição de água escoltados
pela Guarda Municipal (El País, 2015). Em outro extremo, encontram-se as áreas que, ainda que
alarmadas com a falta de chuvas, não tiveram seu abastecimento afetado pela estiagem. Segundo
o Diretor de Produção e Grande Operação da CEDAE, este é o caso da região atendida pelo
Sistema Guandu na metrópole fluminense (Fernandes, 2015).
De acordo com o diretor da companhia, apesar da redução do volume dos reservatórios existentes
no Paraíba do Sul e do volume transposto para o Guandu, foi possível manter a captação normal
de 45.000 litros de água por segundo. Além disso, o segundo maior manancial usado na região, o
Reservatório de Ribeirão das Lajes, não foi afetado pela seca e, desta forma, “ao contrário de São
Paulo, onde a crise hídrica se converteu em uma crise de abastecimento, isso não ocorreu na área
atendida pelo Guandu” (Fernandes, 2015).
Não obstante, mesmo que a estiagem não tenha afetado o abastecimento – como de fato ocorreu
em outros momentos históricos – a crise hídrica tornou-se uma questão relevante para diferentes
setores da sociedade fluminense. A possibilidade de racionamento ou rodízio de abastecimento
discutida para São Paulo criou o temor de que medida semelhante se tornasse necessária no Rio
de Janeiro. A simples ideia de receber água um número determinado de dias por semana e o clima
gerado pelo tratamento do tema pela mídia fez com que a questão do saneamento retornasse ao
debate público. Vários eventos e debates foram então organizados pela universidade, pelo poder
legislativo, por entidades representativas da indústria, entre outros. No mês de março deste ano,
uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi instalada na Assembleia Legislativa do Estado do
Rio de Janeiro (ALERJ) para “apurar as responsabilidades dos entes públicos e privados perante a
crise hídrica que afeta o estado do Rio de Janeiro e, em especial, sua região metropolitana [...]”
(ALERJ, 2015). Ao mesmo tempo, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, foi criada a Comissão
Especial sobre o Colapso Hídrico, com objetivos semelhantes.
Entretanto, a própria existência de algo que possa ser denominado como crise não é unanimidade
entre gestores e pesquisadores do tema, sem falar em suas causas. Vários pesquisadores vêm
argumentando que a atual crise é, na verdade, uma “crise de gestão”, uma vez que eventos
extremos, como a seca prolongada no Sudeste, devem ser previstos pelos prestadores dos serviços
de saneamento (Heller, 2014; Carta Capital, 2015).
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De um ponto de vista semântico, o uso do termo crise também é controverso. De acordo com
Koselleck, o termo foi empregado na Grécia Antiga nos campos da lei, da medicina e da teologia,
envolvendo escolhas entre alternativas rígidas, como o certo e o errado, salvação ou condenação,
vida ou morte (2006, p. 358). Segundo o historiador alemão, o conceito médico prevaleceu até o
princípio do período moderno, quando, como metáfora, se expandiu para distintos domínios – tais
como política, economia história e psicologia – sendo que no século XVIII retomou sua conotação
religiosa a partir de seu uso para designar os eventos que tiveram lugar nas revoluções francesa e
americana. Assim, a “visão apocalíptica do julgamento final adquiriu um significado secular” (Ibid.,
p. 358) e ganhou importância em decorrência de sua “flexibilidade metafórica”, guardando
decerto um grau de ambiguidade. Com efeito, vários autores chamam atenção para o fato de que
a imprecisão e a polivalência adquirida pelo conceito possibilitaram que ele fosse mobilizado para
designar uma ampla gama de problemas atuais (Morin, 1976; Laroche & Lier, 1982; Samman,
2011), adquirindo grande centralidade no “imaginário global contemporâneo” (Samman, 2011).
Importa destacar aqui, a partir desta breve descrição da elaboração da questão do abastecimento
de água enquanto crise, que os problemas de abastecimento em grande parte da periferia
metropolitana não são novidade. O rodízio de abastecimento é regra para várias áreas da Baixada
Fluminense, onde o provimento de água é realizado através de um complexo sistema de manobras
nas redes, uma vez que a quantidade de água aduzida para a região é insuficiente (DAE, 2014;
Nowaski, 2015). Daí resulta que a periferia enfrenta permanentemente a condição que parece ter
gerado uma verdadeira apreensão no restante da cidade e motivado a emergência da “crise
hídrica”, isto é, o recebimento de água restrito a um determinado número de dias por semana. Tal
situação é ilustrada pela fala de um representante do FAPP-BG na Audiência Pública da Comissão
Especial sobre o Colapso Hídrico na Câmara dos Vereadores, segundo o qual “a crise hídrica na
Baixada é muito familiar; em diversas áreas não chega água, em outras, chega apenas duas ou três
vezes por semana” (Raulino, 2015 b).
A situação na região, que convive com o rodízio independentemente da estiagem, é agravada pelo
fato de vários bairros não possuírem rede de distribuição. Além disso, a falta d’água na Baixada
Fluminense pode tornar-se ainda mais frequente no verão, chegando os períodos sem distribuição
de água a semanas ou até meses (Nowaski, 2015).
Frente aos problemas de abastecimento enfrentados recorrentemente em diversas áreas da
metrópole e à inexistência de evidências de redução da captação no período recente, chama
atenção a emergência da “crise hídrica” na RMRJ. Cabe indagar, portanto, porque a questão foi
assim verbalizada neste momento e, ao mesmo tempo, refletir sobre os motivos que impedem
que as populações que enfrentam a falta d’água crônica na Baixada Fluminense consigam fazer
suas demandas repercutirem na esfera pública, reformulando seus problemas como uma questão
que exija resposta do poder público, o que contrasta com a centralidade que o saneamento
adquiriu para a ampla mobilização ocorrida na década de 1980.
Em síntese, ao mesmo tempo em que ocorreu esta ressignificação da ação relativa ao
saneamento, circunscrevendo-a em um quadro mais amplo que engloba toda a metrópole, uma
vez que todos passam a enfrentar o risco do desabastecimento, há certo silenciamento dos
movimentos que representam as populações que enfrentam efetivamente os maiores problemas
de acesso à água.
De fato, um dos aspectos centrais da forma como vem se dando a construção social da crise
hídrica é a reafirmação do risco difuso da escassez de água, o que acaba por lançar uma cortina de
fumaça sobre as desigualdades estruturais no acesso a tal recurso, posto que existe uma
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coincidência entre as áreas de moradia de populações marginalizadas socialmente e os piores
índices de atendimento pelo serviço público de abastecimento. Deste modo, consideramos
pertinente abordar tal enquadramento a partir do conceito de “sociedade do risco” tal qual
formulado por Ulrich Beck, onde haveria, nas palavras do autor (2010, p. 57),
uma tendência objetiva à unificação das susceptibilidades em situação de
ameaça global. Assim, amigo e inimigo, leste e oeste, em cima e embaixo,
cidade e campo, preto e branco, sul e norte são todos submetidos, no limite, à
pressão equalizante dos riscos civilizacionais que se exacerbam. Sociedades de
risco não são sociedades de classes [...]. Elas contêm em si uma dinâmica
evolutiva de base democrática que ultrapassa fronteiras, através da qual a
humanidade é forçada a se congregar na situação unitária das autoameaças
civilizacionais.
Em síntese, o foco deixa de ser a desigualdade – seja na exposição ao risco ou no acesso à água –
para uma ameaça global e indiferenciada, ou seja, a “susceptibilidade de todos em razão de
imensos perigos mais ou menos palpáveis” (Beck, 2010, p. 59). Assim, a ausência de chuvas – seja
desencadeada por processos na escala global, a exemplo das tão debatidas mudanças climáticas
globais, ou nas escalas nacional ou regional, como os desmatamentos das cabeceiras de rios,
destruição de nascentes e poluição de corpos hídricos – desencadearia uma ameaça que paira
sobre todos, independentemente do grupo ou classe social. Frente às ameaças, ganha
centralidade o sentimento de medo e o valor da segurança, o que caracterizaria igualmente a
sociedade do risco segundo Beck (2010). O medo, no caso, está relacionado tanto à falta d’água
quanto à qualidade da mesma, como indica pesquisa realizada pelo Instituto Gerp em maio de
2014 a pedido do jornal O Dia 4: segundo o instituto, dos 870 entrevistados no Estado do Rio de
Janeiro, 87% temem a escassez e 50% não confiam na qualidade da água recebida.
A questão da segurança, por sua vez, aparentemente já entrou na agenda do estado de São Paulo.
Inicialmente, a partir dos saques a caminhões-pipa em Itu e, em abril de 2015, o Comando Militar
do Sudeste organizou um painel sobre a crise hídrica, intitulado “O problema do abastecimento de
água para consumo (residencial, industrial e agrícola) no Estado de São Paulo” 5. No mês seguinte,
o exército realizou uma simulação de ocupação da Sabesp em momento de crise (El País, 2015).
Além disso, o emprego do termo “segurança hídrica” 6 se difundiu rapidamente e se tornou
presente nos debates sobre a questão do abastecimento, seja na mídia, em sites de órgão públicos
ou nos debates púbicos sobre o tema.
A representação do problema do abastecimento enquanto crise ou catástrofe com “tendência
objetiva à unificação das susceptibilidades” (Beck, 2010, p. 57) é reforçada tanto por órgãos de
governo quanto pela mídia, que faz uma cobertura que beira ao sensacionalismo – incluindo
encartes especiais, a proliferação de infográficos e de páginas (e até aplicativos para smartphones)
para monitorar o nível dos reservatórios – o que foi caracterizado pela Associação dos Geógrafos
Brasileiros (AGB) como “terrorismo hídrico” que pouco contribui para enfrentar os conflitos pelo
uso da água e para o debate acerca das soluções para o abastecimento (AGB, 2015) e leva, em
última instância, à despolitização do problema. A AGB destaca, ainda, o “ambiente de medo,
culpabilização e disputa em torno da água” (Ibid., p. 6).
4
https://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-06-23/fluminenses-sao-solidarios-na-crise-de-agua-do-vizinho.html
5
https://www.pucsp.br/sites/default/files/img/aci/painel_sobre_crise_hidrica.jpg
6
Vamos falar sobre Segurança Hídrica; https://www.segurancahidricarj.com.br/segurancahidrica.
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A abordagem de Pierre Bourdieu sobre a “construção social dos problemas públicos” e da “opinião
pública”, bem como sobre o papel das “comissões” em tal processo pode, a nosso ver, ser
bastante elucidativa. De acordo com o autor, o Estado esforça-se por reforçar certos pontos de
vista que, apesar de constituírem o “ponto de vista oficial” e contribuírem para a construção da
opinião pública, não passa de uma das diversas formas de se encarar determinada questão,
influenciada, por conseguinte, pela localização no espaço social.
As comissões têm um papel fundamental nesse processo de reforço de um ponto de vista em
detrimento dos demais, ou da construção da “opinião pública esclarecida”, para o que é
imprescindível que “apareça como uma comissão de sábios, isto é, acima das contingências, dos
interesses, dos conflitos, fora do espaço social enfim, pois, desde que estamos no espaço social,
somos um ponto, portanto um ponto de vista relativizável” (Bordieu, 2014, p. 61). Assim,
Para conseguir esse efeito de des-particularização, esse conjunto de
instituições a que chamamos ‘o Estado’ deve teatralizar o oficial e o universal,
deve dar o espetáculo do respeito público pelas verdades públicas, do respeito
público pelas verdades oficiais em que a totalidade da sociedade
supostamente deve se reconhecer. Deve dar o espetáculo do universal, aquilo
sobre o que não pode haver desacordo porque está inscrito na ordem social
em determinado momento no tempo (Bourdieu, 2014, p. 61)
A “crise hídrica” aparece, por vezes, não apenas inscrita na “ordem social”, mas, principalmente,
em algum tipo de ordem “natural”, visto que foi desencadeada, entre outras coisas, por um
período prolongado com chuvas abaixo da média mensal. Decerto, não é o caso aqui de se negar
as evidências meteorológicas de uma seca prolongada, mas de problematizar as causas da mesma
e, principalmente, o porquê da construção social da crise hídrica neste momento, ainda que
milhões de pessoas na RMRJ sofram há décadas com o que se espera que seja o efeito da crise: o
racionamento ou rodízio de abastecimento.
FORMAS COTIDIANAS DE RESISTÊNCIA EM CAMPOS ELÍSEOS?
O Bairro de Campos Elíseos está localizado no segundo distrito de Duque de Caxias, em área
contígua ao Polo Petroquímico que surgiu em torno da REDUC - uma das maiores refinarias de
petróleo da Petrobras. O bairro apresenta graves problemas de abastecimento de água e é palco
de um conflito pelo recurso. De acordo com os dados do Censo 2010 do IBGE, apenas um quinto
dos domicílios possui acesso à rede pública, sendo consequentemente muito comum o uso de
poços pelos moradores – presentes em um terço das residências. Grande parte dos domicílios
(43%) possui “outra forma de abastecimento de água” – segundo a classificação do instituto estas
incluem poços ou nascentes fora da propriedade, carros-pipa, água da chuva não armazenada em
cisterna, entre outras fontes (IBGE, 2010). No caso de Campos Elíseos, pode-se acrescentar a água
irregularmente utilizada das adutoras do polo industrial. Duas adutoras levam a água necessária ao
refino de petróleo e outros processos industriais até o polo: uma delas capta água na Estação de
Tratamento de Água (ETA) Guandu e outra na represa de Saracuruna, localizada na Reserva
Biológica do Tinguá.
Na ausência de abastecimento público, moradores das ruas por onde passam as adutoras fazem
por conta própria ligações precárias para levar água dessas tubulações até as residências. Essa
solução informal expõe os consumidores a diversos riscos; por um lado, ao risco de corte da água,
uma vez que a captação pode ser considerada pelas empresas como furto, por outro, riscos à
saúde, decorrentes da possibilidade contaminação da água e da ausência de tratamento.
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A compreensão da aparente apatia dos habitantes de Campos Elíseos requer o entendimento de
um processo mais geral da metrópole fluminense: o aprofundamento da segregação socioespacial.
Ribeiro e Ribeiro (2015) demonstram em artigo recente que há um aumento da segregação
residencial nesta região. Segundo os autores,
a periferia da metrópole do Rio de Janeiro tem se tornado cada vez mais
popular, tanto em função da redução da importância do operariado industrial
na estrutura social dessa metrópole quanto de perda de importância dos
agricultores, tornando-se, cada vez mais, espaços polarizados em relação aos
espaços de tipo superior da metrópole, tendo em vista o peso relativo elevado
das camadas inferiores da estrutura social nesses espaços da periferia.
Destarte, de acordo com a concepção aqui adotada, é possível supor que se intensifica a
assimetria de poder e que os moradores da Baixada Fluminense tendem a enfrentar maiores
desafios a sua organização – como foi, de fato, apontado por lideranças da região. Além disso,
como consequência desse processo, afastam-se das esferas de decisão.
Porém, como convenientemente nos adverte Scott (2002), o fato de o ciclo de protestos não estar
em sua fase mais pujante não exclui a possibilidade de ocorrerem “silenciosas guerrilhas”. Estas,
no caso aqui abordado e em tal contexto de assimetria de poder, podem ser tanto a forma de
garantir o acesso à água para a sobrevivência cotidiana quanto a forma como essas populações
conseguem contestar as prioridades da política de abastecimento. Ademais, isso que estamos aqui
considerando uma forma de resistência cotidiana – com base no pensamento do autor – pode
também resultar em mudanças nas políticas de abastecimento de água. O caso de Campos Elíseos
é usado aqui para elucidar este argumento.
Para fazer frente à situação do abastecimento no bairro, a CEDAE propõe duas soluções:
primeiramente, o uso da água do Guandu não consumida no polo petroquímico, que será tratada
e redistribuída; e, em segundo lugar, o uso da água da represa de Saracuruna, cuja outorga seria
transferida da Petrobras para a CEDAE a fim de que possa ser utilizada para o abastecimento
público.
Assim, se de um ponto de vista os “furtos” de água das adutoras da REDUC são, decerto, a única
fonte de água de parte da população, de outro, essa forma de “resistência cotidiana” pode ser
considerada a maneira encontrada pela população para questionar as prioridades de uso da água
na região. O Estado, por sua vez, não podendo permanecer indiferente a tal questionamento –
uma vez que a própria legislação brasileira define o uso humano como prioritário – acaba tendo
grande tolerância com esses pequenos furtos em algumas áreas, o mesmo valendo para a empresa
(REDUC), mesmo que eles sejam de conhecimento de todos na região.
Com efeito, segundo Scott (2002), a natureza de algumas dessas estratégias de resistência acaba
por criar um “silencio cúmplice”, uma vez que, para o Estado, reconhecê-las seria admitir a
impopularidade de suas políticas. Seria, igualmente, um reconhecimento da ausência ou
precariedade de sua autoridade em certas áreas, uma vez que o ente estatal não consegue fazer
valer a lei. Ainda mais relevante é o fato de que, atualmente, o poder público, a companhia de
saneamento, a Prefeitura e a Petrobras (proprietária da adutora que leva água para o polo
petroquímico) venham negociando o uso de parte dessa água pela população, como efetivamente
acontece. Ou seja, os furtos de água acabaram desvelando uma situação de negação do direito a
este bem fundamental à vida e marcando, igualmente, um embate entre o fornecimento de água
para uso industrial e o acesso à água de quase seis mil famílias que atualmente fazem uso de
fontes precárias. Essa “guerrilha silenciosa” indicou, por fim, as fontes possíveis de água para o
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bairro: a água que já é aduzida até ele do sistema Guandu e a água de excelente qualidade da
represa de Saracuruna, ambas atualmente usadas apenas para o abastecimento industrial. Foi,
portanto, nas palavras de Scott, uma forma dessa população marcar “presença na política” (Ibid.,
p. 13) e de influenciar as políticas do Estado.
CONSTRUÇÃO E DESCONSTRUÇÃO DOS SENTIDOS DA AÇÃO RELACIONADA AO
SANEAMENTO
A sistematização da história do Comitê de Saneamento da Baixada Fluminense e de seus
antecedentes teve como objetivo contribuir com a compreensão das motivações que levaram
moradores da periferia metropolitana a se mobilizar em torno da questão do saneamento na
década de 1980. Igualmente, objetiva trazer elementos que colaborem com a compreensão do
aparente “silenciamento” dos movimentos sociais em torno desta questão na atualidade, mesmo
que os velhos problemas não tenham sido definitivamente solucionados.
A valorização da dimensão temporal do confronto político presente na abordagem teórica aqui
mobilizada (McAdam et al., 2009; Tarrow; 2009; Tilly, 1999; Tarrow, 2012), possibilitou
compreender o surgimento do Comitê em uma conjuntura de abertura política após duas décadas
de regime autoritário e as oscilações em sua atuação na luta pelo saneamento, bem como a
(aparente) desmobilização ocorrida a partir do final da década de 1990.
Nesta perspectiva, a estrutura política compreendida pela ditadura apresentou uma série de
limitações aos movimentos, tendo como resultado a destruição da arena pública que vinha se
constituindo e a desarticulação da maior parte das associações, ocasionando sua retração a
espaços semi-públicos ou “microarenas”, i.e., o “interstício tenso situado entre os espaços
públicos e privados” (Acselrad, 2015, p.61). Nos municípios da periferia do RJ, a Igreja Católica foi
este espaço privilegiado de refúgio da atividade política, tendo sido, nesse contexto, um dos
principais aliados dos movimentos. Esse processo é revelado por diversos depoimentos que
descrevem a Igreja como um “espaço de encontro e articulação política” (Quintela, 2007) e como
um “campo neutro para a organização das bases” (Andrade, 2007).
Se, de um lado, é possível pensar o regime ditatorial como uma restrição aos movimentos, de
outro, a reabertura política surge como uma oportunidade para que todos os movimentos que
vinham se organizando silenciosamente emerjam como atores políticos que podem, por fim,
reivindicar direitos ao Estado. Dessa maneira, as associações de bairro existentes puderam se
organizar em torno de federações de modo a contribuir com a formação de movimentos de bairro
onde eles ainda não tinham surgido.
Um fato relevante para a análise aqui proposta é que o momento foi de redefinições dos
problemas vivenciados cotidiana e localmente em vários níveis. A formação de federações
municipais, assim, colaborou para compreensão do saneamento enquanto problema regional, o
que teve grande importância para elevação desta causa ao foco da mobilização.
Da mesma forma, a construção de novos quadros de ação coletiva (Snow, 2001) através do o
trabalho de significação e construção do sentido da ação realizado pelas lideranças do comitê e
seus aliados, teve como resultado uma amplificação da adesão ao movimento. Assim, como
apontado anteriormente, o processo de enquadramento da questão do saneamento realizado
pelas federações orientou a ação para o nível estadual, através da criação de uma luta unificada
pelo saneamento de toda a Baixada Fluminense.
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Além desta questão, ocorreu, no decorrer deste trabalho de significação, outro deslocamento
relevante: o enquadramento do problema enquanto uma questão de injustiça. Contribuíram para
este novo quadro a ação dos clérigos vinculados à Teologia da Libertação – os quais trabalhavam a
questão do acesso ao saneamento enquanto uma injustiça social – e os militantes dos partidos
comunistas – que, por sua vez, inscreviam tais injustiças no âmbito da exploração de classes e da
desigualdade centro-periferia.
Na prática, as demandas do movimento tiveram como resultado o início da execução do PEBS em
1985, que propunha ações de saneamento integrado em toda a Baixada. Entretanto, como ficou
claro, esse olhar global não duraria muito: após avanços e recuos na concepção das políticas de
saneamento para a região, o Programa Nova Baixada passou a executar ações focalizadas as. Sem
pretender avaliar tal política – o que está além dos objetivos aqui propostos – cabe ressaltar que,
ao que tudo indica, seus efeitos sobre a participação social foram devastadores, especialmente a
partir da criação dos Comitês Gestores Locais. Ao propor uma estrutura de participação com
espaço restrito aos beneficiários imediatos e alijar o Comitê do processo (Porto, 2003), o programa
fez o caminho inverso ao proposto nos anos 1980 pelo movimento popular: através do
reescalonamento descendente (Swyngedouw, 2004) da esfera da participação, perdeu o olhar
regional do problema e contribuiu para reforçar, mais uma vez, políticas clientelistas e populistas
tão frequentes na Baixada Fluminense. Essas “políticas de escala” possuem, de fato, o potencial de
empoderar certos grupos e gerar o desempoderamento de outros (Swyngedouw, 2004; Brandão,
2009).
Em relação à questão do saneamento na Baixada Fluminense nas décadas de 1980, 1990 e 2000, é
possível notar, entre outras coisas, um embate político pela redefinição das escalas de
participação através da legitimação e deslegitimação de algumas escalas em proveito de outras.
A construção da crise hídrica e o consequente enquadramento do problema do abastecimento em
uma escala mais ampla (estadual ou regional-Sudeste), por sua vez, contribuiu para o
desempoderamento dos movimentos locais. Este enquadramento da questão hídrica, apesar de
ter contado com o aporte de alguns ambientalistas, não levou à formação de um movimento social
no Rio de Janeiro na concepção de McAdam e colaboradores (2009), ou seja, como um desafio aos
poderes estabelecidos sustentado no tempo. Ao contrário, pareceu mesmo ser promovido por
agentes da elite política que ajudaram a traçar seus contornos em comissões parlamentares.
A preocupação central das comissões e da mídia dividiu-se entre questões ambientais e de gestão.
Em relação às primeiras, foi muito debatido o tema da redução da pluviosidade, das mudanças
climáticas globais (MGC), da segurança hídrica e do risco. Os temas relacionados à gestão focaram
na regulação, no funcionamento do sistema hidráulico do Paraíba do Sul, na possibilidade de
racionamento e nas perdas de água pelas concessionárias na distribuição. Além destas
preocupações, algumas soluções foram debatidas, sendo a principal delas o Guandu 2, projeto
através do qual o Governo do Estado pretende aumentar a produção do sistema Guandu em até
24 mil litros/s em duas etapas.
O peso da questão da escassez de água, da necessidade de ampliação dos sistemas, do risco e da
segurança, nos leva a indagar sobre o papel da “crise hídrica” na construção do consenso em torno
da visão de que o problema de acesso à água seria principalmente quantitativo, em detrimento
das desigualdades de acesso entre os diferentes grupos sociais. Desta forma, contribui na
justificação de grandes obras programadas pelo estado antes mesmo da emergência da crise,
como o Guandu 2.
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Algumas ações contestatórias no nível local, porém, permanecem presentes, como foi
exemplificado no caso de Campos Elíseos. Estas, muitas vezes, podem não se apresentar na forma
de grandes manifestações públicas, mas possuem o potencial de contestar as políticas de Estado e
gerar respostas em termos de políticas públicas.
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