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Língua cristã

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Língua cristã

Papiá kristáng

Falado(a) em: Singapura, Malásia
Total de falantes: Entre 900 e 2150[1] [2]
Família: Crioulos de base portuguesa
 Crioulos malaio-portugueses
  Malásia
   Língua cristã
Estatuto oficial
Língua oficial de: nenhum(a) região/país
Regulado por: sem regulação oficial
Códigos de língua
ISO 639-1: --
ISO 639-2: ---
ISO 639-3: mcm

A língua cristã, português de Malaca, crioulo de Malaca, malaquês,[3] papiá kristáng ou simplesmente papiá, é uma língua crioula de base portuguesa com estrutura gramatical próxima do malaio, falado na Malásia e em Singapura pelos descendentes dos descobridores portugueses e suas famílias miscigenizadas. Papiá é a pronúncia crioula de papear, i.e., falar, conversar, dizer. Kristáng é a pronúncia de "cristão", posto que a maioria dos falantes do citado crioulo seguiam a religião cristã, oficial em Portugal e seus domínios coloniais ultramarinos.

Distribuição

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A língua tem cerca de 800 falantes em Malaca,[3][4] dos quais 100 são falantes plenos, do total de 1000 a 2000 que constituem a comunidade actual kristáng na cidade. Há também alguns falantes em Kuala Lumpur e Singapura devido à emigração, havendo menos de 100 falantes fluentes em Singapura[5] e não se conhecendo o estado da língua em Kuala Lumpur. O kristáng é também falado por alguns imigrantes e seus descendentes no Reino Unido, para onde alguns se mudaram após a independência, e também na Austrália, em particular na cidade de Perth, que é um destino popular de retornados na comunidade. Em Pulau Tikus havia mais falantes em 1997 que em 1987.

A língua encontra-se ameaçada, com baixa transmissão para a juventude, perdendo importância social para o inglês e o malaio,[6] tendo esforços de revitalização encontrado dificuldades na pandemia do Covid-19.[7]

Interessados em dominar o estratégico estreito de Malaca, por onde escoavam as especiarias oriundas das Filipinas, de Timor-Leste, das Ilhas Molucas e de Macau, os portugueses se apossaram da região em 1511, estabelecendo uma feitoria e um forte, posteriormente tomados pelos Países Baixos por iniciativa da Companhia das Índias Orientais. Ulteriormente toda a região e zonas próximas cairiam sob administração britânica, assim permanecendo até a Segunda Guerra Mundial, quando esteve sob fortes ataques da expansão nipónica no sueste asiático. Atualmente faz parte da Malásia.

Ao chegarem a Malaca, os portugueses se depararam com a cultura Penang, fruto da mestiçagem entre comerciantes chineses e malaias. Paulatinamente, o português se mesclou com o malaio e palavras de origem chinesa. Desta fusão das três línguas surge o papiá kristáng, crioulo de base portuguesa com influências fonéticas e gramaticais dos substratos chinês e malaio. A comunidade de falantes descende principalmente de casamentos entre navegadores portugueses e mulheres locais malaias, assim como de um certo número de migrantes vindos de Goa, eles próprios de ascendência indo-portuguesa.

O kristáng teve uma influência substancial no Patuá macaense, a língua crioula falada em Macau, dado à migração substancial de Malaca após a região ser ocupada pelos holandeses. Mesmo após Portugal perder Malaca e quase todo o contacto em 1641, a comunidade kristáng largamente preservou a sua língua. Devido a melhores condições de vida e trabalho em Singapura, centenas de falantes de Papiá kristáng fixaram-se no país vizinho e levaram o crioulo consigo; porém, com os casamentos com singapureanos a tendência é ao desaparecimento do kristáng em Singapura. Em Malaca a comunidade crioulófona falante de papiá kristáng conta com escola e associação. Foi publicado um dicionário de português-papiá kristáng, e o crioulo e sua comunidade foram tema de um artigo da Revista de Cultura do Instituto da Cultura de Macau.

Diferentemente do que se diz nas histórias da comunidade kristáng em Malaca, a dança do vira não foi introduzida pelos primeiros colonizadores portugueses chegados nas caravelas, mas sim por padres lusitanos enviados nas décadas de 40 e 50 pelo governo português para assistir religiosamente a comunidade crioula e transmitir-lhes um pouco da cultura portuguesa metropolitana.[8]

O dialecto kristang oferece uma simplicidade a língua portuguesa com relação conjugação dos verbos. Os advérbios "já" e "ainda" tornam se partículas que põem o verbo em tempo passado e presente respectivamente, pondo o verbo no infinitivo,. Exemplos:

Yo já comer = eu (já) comi.
Yo ainda comer = eu (ainda) comerei.

Expressões Comuns

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Mutu merseh (port. Muito obrigado)
Teng bong? (port. Estás bem?)
Bong pamiang (port. Bom dia)
Bong atadi (port. Boa tarde)
Bong anuti (port. Boa noite)
yo (port. eu)
bos (port. vós)
bolotudu (port. vós todos, vocês todos)
mai (port. mãe)
pai (port. pai)
muleh (port. mulher)
maridu (port. marido)
bela (port. velha)
belu (port. velho)
Quenino ou Kenino (Port. Pequenino)
godru (port. gordo)
Bonitu (port. bonito)
festa (port. festa)
ungua, dos, tres, kuatu, singku, sez, seti, oitu, novi, des (port. um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez)

Poema de Malacca

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Keng teng fortuna ficah na Malaka,
Nang kereh partih bai otru tera.
Pra ki tudu jenti teng amizadi,
Kontu partih logo ficah saudadi.
Ó Malaka, tera di San Francisku,
Nten otru tera ki yo kereh.
Ó Malaka undi teng sempri fresku,
Yo kereh ficah atih moreh.

Tradução em português:

Quem tem fortuna fica em Malaca,
Não quer partir para outra terra.
Por aqui toda a gente tem amizade,
Quando partir logo fica a saudade.
Ó Malaca, terra de São Francisco,
Não há outra terra que eu quero.
Ó Malaca, onde tem sempre ar fresco,
Eu quero ficar até morrer.

Referências

  1. Idiomas em risco
  2. Survey chapter: Papiá Kristang
  3. a b «Malaccan Creole Portuguese». Idiomas em risco. Consultado em 21 de setembro de 2023 
  4. «APiCS Online - Survey chapter: Papiá Kristang». apics-online.info. Consultado em 21 de setembro de 2023 
  5. Wong, K. M. (1 de dezembro de 2019). «Kodrah Kristang: The Initiative to Revitalize the Kristang Language in Singapore». Consultado em 21 de setembro de 2023 
  6. Pillai, Stefanie; Baxter, Alan N.; Soh, Wen-Yi (abril de 2021). «Malacca Portuguese Creole». Journal of the International Phonetic Association (em inglês) (1): 93–102. ISSN 0025-1003. doi:10.1017/S0025100319000033. Consultado em 21 de setembro de 2023 
  7. Portuguesa, Observatório da Língua (8 de abril de 2021). «O Papiá kristáng de Malaca 'migra' da sala de dança e música para a internet». Observatório da Língua Portuguesa. Consultado em 21 de setembro de 2023 
  8. O’Neill, Brian Juan (21 de março de 2018). Branco, Jorge Freitas; Castelo-Branco, Salwa El-Shawan, eds. «Capítulo 41. Folclorização e identidade crioula no bairro português de Malaca». Lisboa: Etnográfica Press. Antropologia: 587–598. ISBN 979-10-365-1123-3. Consultado em 22 de setembro de 2023 

Ligações externas

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